Política,

A bolha made in Brazil

Jornalista investiga a política externa e as multinacionais brasileiras na Era Lula

05nov2018 • Atualizado em: 02abr2024 | Edição #1 mai.2017

Lula estava recém-eleito quando explicou a empresários reunidos no BNDES seus planos de expansão da influência brasileira mundo afora. A política externa ganharia inédita “intensidade”. O Brasil se convertia em um “país grande” e não precisava “pedir licença” para abocanhar mercados ou seduzir governos. A fronteira do capitalismo brasileiro deveria ser, sobretudo, a América do Sul e a África.

Euforia e fracasso do Brasil grande, do jornalista Fábio Zanini, conta histórias do que aconteceu, ao longo dos oito anos seguintes, na outra ponta desse amálgama de diplomacia, empresas “campeãs nacionais” e crédito subsidiado — e cujas entranhas a Operação Lava Jato está expondo. Zanini passou por cinco países, entrevistando brasileiros que se aventuravam por lugares improváveis e moradores locais afetados.

Na Namíbia, é a história de uma missão naval determinada a fazer do Atlântico Sul uma zona de influência brasileira, e do fracasso de empresários nacionais atrás de petróleo. Em Angola, de como a Odebrecht se associou a uma petro-ditadura, tocando de obras de infraestrutura a redes de supermercado. No Peru, da estrada brasileira que vence os Andes para escoar cana pelo Pacífico.

Mistura de investigação jornalística e diário de viagem em primeira pessoa, o livro é leve e centrado em histórias, e não se propõe a examinar causas estruturais. Ainda assim, entra em um terreno completamente inexplorado pela literatura acadêmica – e é esse seu maior valor.

O debate acadêmico sobre a política internacional de Lula ainda ignora a relação entre empresas nacionais e o governo. Fala-se sobre temas como o ideário “Sul-Sul” — de aproximação com países em desenvolvimento —, ou da afinidade ideológica do PT com certos governos. Mas a simbiose entre agentes públicos e atores privados, regada a subsídios estatais, tráfico de influência e corrupção pura, ainda não foi objeto de uma pesquisa aprofundada.

Hoje não restam dúvidas de que esse foi um dos motores do projeto internacional brasileiro dos anos 2000. Assim, deve ser colocado no centro do debate, como o faz pela primeira vez Zanini.

Quem escreveu esse texto

Roberto Simon

É analista de risco político para a América Latina.

Matéria publicada na edição impressa #1 mai.2017 em maio de 2017.