A Feira do Livro, Literatura brasileira,

Encontro com o feminino

Djamila Ribeiro fala sobre como foi entrar em contato com a sua memória ancestral

10jun2022 • Atualizado em: 14maio2024 | Edição #58

Lançado pela Companhia das Letras durante a pandemia, Cartas para minha avó, de Djamila Ribeiro, terá seu primeiro lançamento presencial hoje (10), às 19h, no Palco da Praça, n’A Feira do Livro, com mediação da jornalista e escritora Adriana Ferreira Silva.

A obra trata das memórias das mulheres que marcaram a trajetória da filósofa, como sua mãe, sua avó e sua filha. À Quatro Cinco Um, Ribeiro fala sobre o livro e como o selo Sueli Carneiro, da editora Jandaíra, e a coleção Feminismos Plurais, da editora Pólen, ambos sob sua coordenação, ajudam a dar visibilidade a autores negros no mercado editorial brasileiro.

Em Cartas para minha avó, você traz relatos mais pessoais, ligados à sua família. Como foi o processo de se voltar para essas memórias?
Foi difícil revisitar essas memórias, entrar em contato com perdas, lutos e a elaboração dessas dores. Foi um desafio escrever, me custou caro emocionalmente. Chorei muito durante o processo da escrita. Ao mesmo tempo, foi um livro que eu fiquei muito feliz de poder ter escrito.

Foi importante entrar em contato com (e reconhecer) esse feminino na minha família. São quatro mulheres negras em diálogo — eu, minha mãe, minha avó e minha filha —, trazendo esse lugar da valorização desse cuidado, que não é reconhecido na nossa sociedade. Coloco essas mulheres em um lugar de protagonismo na construção das nossas famílias. Apesar de ter sido muito difícil, foi o livro que eu mais gostei de ter escrito.

“Quem tem medo do feminismo negro?”, de Djamila Ribeiro, intercala autobiografia e reflexão política sobre a mulher negra no Brasil

Como tem sido coordenar o selo Sueli Carneiro, da editora Jandaíra, e a coleção Feminismos Plurais, da editora Pólen?Coordenar esses projetos me deixa bastante feliz, porque entendo a importância de publicarmos autores negros e autoras negras no Brasil. O mercado editorial é muito fechado. Esses projetos cumprem um papel importante de dar visibilidade a dezenas de intelectuais negros e de outros grupos, como mulheres quilombolas. Havia uma demanda reprimida de como as pessoas queriam se ver nas publicações, mas também de como fizemos isso: com livros baratos e linguagem acessível.

Editoras grandes têm publicado cada vez mais autores negros. Na sua opinião, a que se deve o aumento dessa procura?
Ainda enfrentamos resistência do mercado editorial, que tem esse domínio branco masculino. Uma pesquisa da Universidade Federal do Rio de Janeiro mostrou que 90% dos livros publicados são de pessoas brancas. Hoje eu publico na Companhia das Letras, tenho livros na lista dos mais vendidos, mas eu me publiquei primeiro, com Lugar de fala, em 2017. Publiquei também outros autores negros, e isso fez com que outras editoras olhassem para nós. Esse aumento se deve às iniciativas das pessoas negras de publicarmos umas às outras. Nós forçamos as grandes editoras a olhar para nós e a romper com a ideia de que nossos
livros não vendem.

Você está preparando algum livro novo no momento?
Por enquanto, não. Lancei o Cartas para minha avó durante a pandemia, remotamente. Agora vou começar a fazer os eventos presenciais e estou muito animada com isso. Inclusive o primeiro vai ser n’A Feira do Livro.

Quem escreveu esse texto

Paula Carvalho

Jornalista e historiadora, é autora e organizadora de Direito à vagabundagem: as viagens de Isabelle Eberhardt (Fósforo).

Matéria publicada na edição impressa #58 em fevereiro de 2022.