
Repertório 451 MHz,
Paulo Leminski na Flip 2025
A curadora Ana Lima Cecilio celebra a poesia acessível e irreverente do homenageado deste ano. Episódio marca a estreia de Bruna Beber como colunista do 451 MHz
25abr2025Está no ar o 136º episódio do 451 MHz, o podcast dos livros. Neste programa, o tema é o poeta Paulo Leminski (1944–89), autor homenageado da Flip deste ano. A editora Ana Lima Cecilio, curadora da Festa Literária Internacional de Paraty, fala sobre a poesia e outras facetas literárias do autor curitibano. Ela conversa com o apresentador do 451 MHz, Paulo Werneck, e também com Bruna Beber, que nesta edição estreia como colunista do podcast.
Uma vez por mês, a poeta e tradutora vai participar de um episódio, trazendo suas referências e seu bom-humor para entrevistar grandes personalidades do universo literário. O episódio foi realizado com o apoio da Lei Rouanet – Incentivo a Projetos Culturais.
Ana Lima Cecilio é formada em filosofia pela USP e atua há mais de vinte anos no meio editorial, trabalhando com edição, clubes do livro, livrarias e curadoria literária. Ela foi a responsável por trazer ao Brasil os livros de Elena Ferrante, um dos maiores sucessos literários dos últimos anos, e trabalhou em edições de Samuel Beckett, Hilda Hilst e outros grandes autores. Este é seu segundo ano como curadora da Flip, que em 2025 acontece de 30 de julho a 3 de agosto.
Já Bruna Beber, além de poeta e tradutora, é letrista com uma sólida parceria com a cantora Letrux. Ela já traduziu para o português as narrativas de grandes autores da língua inglesa, como William Shakespeare, Lewis Carroll, Neil Gaiman e Dr. Seuss.

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Em junho deste ano, Bruna lança a coletânea Romance em doze linhas e outros poemas (Companhia das Letras), que reúne seus cinco primeiros livros. O volume traz no título o nome de um dos seus poemas mais conhecidos, sobre as fases de um relacionamento. O poema viralizou nas redes sociais.
Poeta popular
Neste episódio, Ana Lima Cecilio conta por que escolheu Paulo Leminski como autor homenageado da Flip de 2025. Ela fala também sobre como a poesia dele segue viva até hoje e inspira poetas contemporâneos. Ana explica que, no processo de escolha do autor homenageado deste ano, quis dar espaço para um nome que possibilitasse conversas múltiplas, para que as discussões não girassem apenas em torno de seus livros.
“Eu tinha ficado um pouco com uma culpa pela Flip do ano passado [2024], por ter tido pouca poesia”, confessa. “E aí pensei no Leminski, que é uma paixão de infância, de adolescência, mas que é também uma figura muito norteadora do que se fez de poesia depois.”
Um dos poetas brasileiros mais populares, Leminski é conhecido por seu estilo próprio de escrever poesia, com versos cheios de trocadilhos, ditados populares e gírias. Ele nasceu em Curitiba, no Paraná, filho de pai polonês e mãe negra. Morreu em 1989, aos 44 anos, por complicações de uma cirrose hepática.
“Ele tinha uma postura de fazer com que a literatura chegasse às pessoas, de tirar o encastelamento da poesia como uma coisa difícil, hermética, feita para iniciados, e fazer chegar na camiseta, na pichação de muro”, afirma Ana Lima.

Ela destacou também que um dos motivos da poesia de Leminski se derramar para fora das páginas dos livros é porque ele escrevia dando “uma piscadela” para o leitor. “Faz parte da poesia você quebrar a expectativa do leitor, você contar primeiro com um repertório comum de ditado popular. Porque a gente, como leitor, vai completar o ditado, e aí ele vem e corta. E você fala: é claro, como é que eu não pensei nisso?”, diz.
As artimanhas de Leminski marcaram os anos de formação de Bruna Beber. “Eu me lembro de uma que mudou a minha vida: ele falava ‘o senhor é meu pastor, vamos pastar’”, se diverte Bruna ao lembrar de um verso do curitibano.
“Tem gente que pode torcer o nariz e achar que ele não é elevado o suficiente. Mas eu acho que a leitura reiterada dele mostra que tinha ali um manancial de coisas para a gente pensar em linguagem e literatura que é muito precioso”, acredita a curadora da Flip.
Embora seus versos sem letras maiúsculas ou pontos-finais sejam mais conhecidos, Leminski também escreveu prosa experimental. Seu primeiro livro publicado foi Catatau (Iluminuras, 1975), um “romance-ideia”, como ele denominou, com um monólogo de René Descartes em visita a Pernambuco no período da ocupação holandesa, no século 17.
Poeta compositor
O episódio do podcast também destaca as múltiplas atividades de Leminski, um artista multifacetado. Além de poeta, ele foi publicitário, professor de cursinho pré-vestibular, crítico literário, tradutor, compositor e judoca faixa preta.
“A poesia do Leminski tem um alto grau de comunicabilidade intencional. Acho que por ele ter sido poeta, professor, tradutor, crítico, escritor publicitário, existia ali uma intenção de comunicação. E eu acho que isso se deve ao fato do Leminski ser um poeta compositor e uma pessoa que se formou como poeta na música popular brasileira”, afirma Bruna Beber.

Ana Lima concorda e valoriza a dimensão poética dos grandes letristas e compositores da música popular. “A gente tem uma coisa de falar que no Brasil ninguém lê poesia, que poesia não vende e tal. Cara, a gente é o país da poesia por excelência, que é a poesia da música popular e o Leminski teve uma compreensão disso”, defende.
Como compositor, Leminski teve suas letras gravadas e interpretadas por grandes nomes da música brasileira como Caetano Veloso, Arnaldo Antunes, Guilherme Arantes, Ney Matogrosso, Zélia Duncan, Itamar Assumpção, entre outros.
Leminski na Flip
Diante de uma produção tão variada, como equilibrar todos os lados de Leminski na programação da Flip?
“É muita coisa, mas eu fico tentando mapear o que não pode faltar”, responde Ana Lima. “A gente vai fazer antes da Flip, provavelmente em junho, no Centro de Pesquisa e Formação do Sesc aqui em São Paulo, o ciclo do autor homenageado, com quatro ou cinco mesas e atividades que são para discutir a obra dele. E aí eu acho que a gente consegue contemplar tudo, com uma sobre prosa, uma sobre poesia, uma sobre a música…”, explica Ana.
“Eu quero muito que seja possível entender todas essas bandeiras levantadas pelo Leminski. E a escolha do Leminski, além da minha paixão juvenil, foi muito por isso, por entender que ele é um artista, um escritor, um poeta que aponta para todos esses lados”, conclui a curadora.
Mais na Quatro Cinco Um
Em 2024, Ana Lima Cecilio esteve duas vezes no 451 MHz. Em setembro, ela participou do 120º episódio junto com o historiador Luiz Antonio Simas, falando sobre a vida e obra do cronista João do Rio, homenageado em 2024 pela Flip.
Depois, em dezembro, ela voltou ao 451 MHz no 125º episódio. Dessa vez, na companhia do escritor e tradutor Caetano W. Galindo, tratou da vida e obra do escritor curitibano Dalton Trevisan.
Já Bruna Beber foi uma das quatro poetas brasileiras contemporâneas que compartilharam poemas sobre o desejo feminino na edição #84 da revista dos livros, em agosto de 2024. Antes, ela escreveu sobre o projeto experimental para crianças conhecerem a autora modernista Gertrude Stein.
Ela também participou do 117º episódio do 451 MHz, com Gregório Duvivier, numa conversa que aconteceu durante A Feira do Livro de 2024. Já em fevereiro deste ano, voltou ao podcast no 128º episódio. Ao lado de Branca Vianna, falou sobre o romance De quatro (Amarcord), de Miranda July, que traduziu para o português.
Livros de Leminski no episódio
Saiba mais sobre os títulos de autoria de Paulo Leminski que aparecem nesta edição do 451 MHz:
- Caprichos & relaxos: publicado originalmente em 1983 e relançado pela Companhia das Letras em 2016, traz os principais poemas que o curitibano tinha escrito até o início dos anos 80. Muitos deles eram inéditos na época e outros tinham sido publicados em edições independentes ou na revista de arte e vanguarda Invenção, encabeçada pelos líderes do movimento concretista, os irmãos Augusto e Haroldo de Campos, e Décio Pignatari.
- La vie en close: publicado pela primeira vez em 1991 e reeditado pela Companhia das Letras em 2024. É uma reunião de poemas que dialogam com as experimentações da poesia concreta, a coloquialidade da geração marginal e a filosofia da cultura oriental.
- O ex-estranho: publicado em 2009 pela editora Iluminuras, traz uma reunião póstuma de poemas até então inéditos de Leminski.
- Catatau: publicado originalmente em 1975 e relançado pela Iluminuras em 2010, retrata uma viagem do filósofo René Descartes (1596-1650) a Pernambuco no período holandês. Diante da natureza abundante dos trópicos e dos hábitos dos nativos indígenas, Descartes, conhecido por ser um dos pais do pensamento racional, perde contato com a própria razão.
- Vida: lançado em 1990 pela editora Sulina e reeditado pela Companhia das Letras em 2013, reúne quatro pequenas biografias escritas ao longo da década de 80: Matsuó Bashô: a lágrima do peixe, Cruz e Sousa: o negro branco (ambas de 1983), Jesus: a.C. (1984) e Trotsky: a paixão segundo a revolução (1986).
- Gozo fabuloso: publicado em 2004 pela DBA, reúne 29 contos e crônicas e uma pequena introdução de Leminski.
- Agora que são elas: publicado originalmente em 1984 pela Brasiliense e relançado em 2013 pela Iluminuras, é, segundo o próprio Leminski, “um romance sobre a minha impossibilidade de fazer um romance”.
- Ensaios e anseios crípticos: lançado pela editora Unicamp em 2012, traz um primeiro conjunto de textos em que Leminski dizia ter reunido as noções “teóricas” básicas a partir das quais pensava, e um segundo com textos “práticos”, voltados à análise de obras e de autores.
- Guerra dentro da gente: Livro infantojuvenil publicado em 1987 pela editora Scipione, conta a história de um menino pobre chamado Baita, que encontra um velho que lhe ensina a arte da guerra.
- Os sentidos da paixão: coletânea de ensaios publicada em 2009 pela Companhia das Letras, traz o texto de Leminski “Poesia: a paixão da linguagem”.
O melhor da literatura LGBTQIA+
Este episódio traz ainda uma sugestão literária da escritora, ativista indígena e psicóloga Geni Núñez. Ela é autora de Felizes por enquanto: escritos sobre outros mundos possíveis (Planeta, 2024) e Descolonizando afetos: experimentações sobre outras formas de amar (Paidós, 2023). Geni indica Ética bicha: proclamações libertárias para uma militância LGBTQ, de Paco Vidarte, publicado pela N-1 Edições em 2019.

“Esse é um livro que eu gosto muito porque ele não tem uma estética higienizada de falar sobre questões de gênero e sexualidade. É, de certa forma, um manifesto, um convite, uma dança”, resume.
Confira a lista completa de indicações do podcast 451 MHz no bloco O Melhor da Literatura LGBTQIA+.
CRÉDITOS
O 451 MHz é uma produção da Associação Quatro Cinco Um.
Apresentação: Paulo Werneck
Produção: Beatriz Souza
Edição e mixagem: Igor Yamawaki
Identidade visual: Quatro Cinco Um
Para falar com a equipe: [email protected]
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ABRIL, 2025