Repertório 451 MHz,

Poesia, humor e sacanagem

Bruna Beber e Gregório Duvivier lêem versos de seus poemas e conversam sobre algoritmo e música popular

09ago2024 • Atualizado em: 08ago2024

Está no ar o 117º episódio do 451 MHz. Esta edição especial traz uma conversa do humorista, ator e poeta Gregorio Duvivier e da poeta Bruna Beber que aconteceu durante A Feira do Livro de 2024. Com mediação do colunista da Quatro Cinco Um Fernando Luna, eles compartilham com muito humor detalhes da produção poética de cada um e suas visões sobre o universo da criação literária. 

A mesa “Poesia na Praça”, que também contou com a leitura de versos de ambos, aconteceu no dia 3 de julho, na praça Charles Miller, na programação d’A Feira do Livro. O episódio é realizado com o apoio da Lei de Incentivo à Cultura.

Além de ator, humorista e poeta, Gregorio Duvivier é um dos idealizadores do Porta dos Fundos e apresentou o programa Greg News na HBO. Publicou pela Companhia das Letras a coletânea de poemas Ligue os pontos (2013) e Sonetos de amor e sacanagem (2021). Em Portugal, Sonetos (2021) foi editado pela Tinta-da-China. Além disso, ele é o organizador de Poema-piada: breve antologia da poesia engraçada, publicado pela Editora Ubu em 2017. 

Já Bruna Beber é poeta e autora das coletâneas de poemas Rua da padaria (2013) e Ladainha (2017), ambos publicados pela Editora Record. Em 2023, ela publicou Sal de frutas, pela Fósforo, e Veludo rouco pela Companhia das Letras. Ela também é autora do ensaio sobre Stella do Patrocínio, Uma encarnação encarnada em mim, da editora José Olympio. 

Poemas e piadas na praça

Na conversa, os convidados abordaram as intersecções entre humor e poesia, destacando a importância do gracejo no verso. “A graça precisa fazer parte da poesia também”, afirmou Beber, ressaltando que o humor pode enriquecer a expressão poética.

Duvivier, por sua vez, celebrou a tradição da poesia engraçada no Brasil, citando poetas populares como Vinicius de Moraes e Manuel Bandeira, além de grandes nomes do gênero, como Gregório de Matos, Millôr Fernandes e Carlos Drummond de Andrade. “A gente tem a sorte no Brasil de ter ótimos poetas engraçados”, observou, enfatizando a rica história do humor na poesia brasileira.

Questionado sobre como ser humorista e poeta ao mesmo tempo, Gregorio diz nunca ter visto muita diferença entre as duas coisas. “Acham que são coisas antagônicas, como se a poesia fosse algo necessariamente sisudo e como se o humor fosse algo necessariamente frívolo, o que não é verdade”, ele afirma. 

Beber concorda com a visão do humorista, acrescentando que “a possibilidade de humor na poesia tem que ser reiterada sempre”. E destaca o papel significativo dele em sua vida pessoal. “O humor sempre foi muito importante na minha casa, era o modo como as pessoas encaravam a vida”, diz Beber.

Ambos cariocas, os poetas também elogiaram o samba como uma forma de encontrar graça e beleza, mesmo diante da tristeza. “Cantar para sumir a tristeza era o lema da minha casa”, conta Beber, lembrando que cresceu aprendendo a pensar e a ler através dessa perspectiva, valorizando a capacidade de enxergar o lado leve da vida.

Versos e algoritmos 

“Nossa criatividade é constantemente bombardeada pelo algoritmo”, afirma Duvivier, ao refletir sobre poesia em tempos de redes sociais. “O meu pesadelo é virar um produtor de conteúdo.”

“Embora eu ache que as redes sociais certamente ajudam, elas também podem atrapalhar no sentido de começarem a nos pautar ao invés de sermos nós quem as pautamos”, diz o ator. 

Frequentemente usando as redes sociais para falar de livros e divulgar literatura, Duvivier diz preferir o papel ao formato digital. “O meio é a mensagem, ao ler um livro pelo celular você acaba continuando no celular.” 

Já quando se trata do modo de criação, Beber diz gostar de  simplesmente escrever, não dando importância para o meio que vai ser publicado ou a maneira de circulação — seja o livro, um post de instagram ou uma música. “Quero falar, quero cantar, encenar algumas coisas que escrevo.” 

A música na poesia 

Para Beber, a música é, em essência, uma forma de poesia. “Quando escrevo uma música, já a escrevo cantando”, revela, destacando como as palavras na música possuem um ritmo e uma musicalidade inerentes. “As palavras vão sendo sassaricadas.”

Ao falar sobre o assunto, Luna comentou que a epígrafe de Veludo rouco é um trecho de uma canção de Jovelina Pérola Negra. Ao ouvir o audiolivro, narrado pela própria poeta, Luna se surpreendeu com voz da poeta cantarolando os versos da sambista. “Ninguém nunca cantou uma epígrafe”, foi o que disseram os técnicos, de acordo com Beber.

A poeta também colaborou na criação de “Que estrago”, faixa do álbum Letrux em Noite de Climão. Beber e Letícia Novaes, da banda Letrux, escreveram a música juntas em uma tarde carioca. “No show de lançamento do álbum, foi a primeira vez na minha vida que me senti uma poeta russa. As pessoas bradavam os meus versos no Circo Voador”, relata.

Em noite de climão, álbum de Letrux

Duvivier cita poetas como João Cabral de Melo Neto e Ferreira Gullar, cuja popularidade foi amplamente impulsionada pela música. “No Brasil, é tão bonito que as pessoas saem para cantar letras. Em um karaokê, as pessoas estão sempre cantando músicas brasileiras a plenos pulmões”, observa.

O poeta e ator também reflete sobre a importância da música na cultura brasileira e menciona a falta de reconhecimento de alguns artistas no cenário internacional. “O problema do Nobel é que ele não fala português. Se falasse, dariam para Chico Buarque e Caetano Veloso”, diz Duvivier, citando “Estação derradeira” como sua música de cabeceira de Chico Buarque.

Mais na Quatro Cinco Um

Em 2019, Gregorio Duvivier resenhou Prólogo, ato, epílogo (Companhia das Letras, 2019), o livro de memórias da atriz Fernanda Montenegro, na revista dos livros.

Já em 2021, resenhou o livro A piada judaica (2021), de Devorah Baum em tradução de Pedro Sette-Câmara e publicado pela editora Ayiné. 

No mesmo ano, participou do 54º episódio do 451 MHz, junto com o também humorista lisboeta Ricardo Araújo Pereira, sobre humor, poesia, língua portuguesa, amor e sacanagem.  

Veludo rouco, a coletânea de poemas de Beber foi resenhada para a Quatro Cinco Um pelo jornalista Carlos Marcelo. Além disso, o poeta Fabrício Corsaletti indicou o título no quadro O Melhor da Literatura LGBTQIA +, no último episódio do 451 MHz.

Desde 2023, Fernando Luna mantém a coluna The Emoji Review no instagram da Quatro Cinco Um. Nela, põe em prática a máxima de que uma imagem vale mais do que mil palavras desafiando os leitores da revista dos livros a adivinhar grandes títulos da literatura mundial usando apenas emojis.

O melhor da literatura LGBTQIA+

Autor de Fabulosas: histórias de um Brasil LGBTQIA+ (Companhia das Letras, 2023), Patrick Cassimiro indica o livro Baldomero (Ou Babá, para os íntimos, inexistentes), de Leandro Rafael Perez, publicado pela Editora Fósforo em 2022. 

Baldomero (ou Babá, para os íntimos, inexistentes), de Leandro Rafael Perez

“Baldomero é um homem gay que divide uma vida entre Diadema e o centro de São Paulo. O sonho da vida dele é muito simples: ele queria se chamar Valdomiro. Ele não consegue ter intimidade com as pessoas, falando de uma cidade difícil de se conectar como São Paulo. Através do sexo, ele começa a buscar corpos para se preencher. Uma linguagem crua, sem muitos rodeios”, conta Cassimiro.

Confira a lista completa de indicações do podcast 451 MHz no bloco O Melhor da Literatura LGBTQIA+. 

CRÉDITOS

O 451 MHz é uma produção da Associação Quatro Cinco Um.
Apresentação: Paulo Werneck
Produção: Mariana Shiraiwa e Mauricio Abbade
Edição: Igor Yamawaki
Produção musical: Guilherme Granado e Mario Cappi
Finalização e mixagem: Igor Yamawaki
Identidade visual: Quatro Cinco Um
Para falar com a equipe: [email protected]