Habitante de uma lagoa poluída rodeada por lixo de todos os tipos, a rã precisa usar um maiô listrado para proteger a pele delicada. Não admira que tenha nascido com três olhos. A simpática personagem da espanhola Olga de Dios logo descobre que o problema está na fumacenta e macambúzia fábrica que passa o tempo produzindo coisas novas de que ninguém precisa. E que acabam jogadas por ali.

Nada que não possa ser resolvido pelos amigos em equipe: os simpáticos pássaro amarelo, bicho bolota, monstro rosa e monstro azul ajudam a entender que não é preciso produzir tantas coisas novas e a fábrica se transforma em central de reciclagem. Ali, os objetos também são consertados, tudo é colorido e sorridente, a água recolhida serve para regar a horta, chega-se de bicicleta pela ciclovia no meio da floresta. Um leitor de cinco anos passou um bom tempo comparando os dois momentos da fábrica, tentando entender os detalhes da transformação.

Fato é que ela parou de fazer tanta coisa nova e tudo ficou mais limpo, produtivo, colaborativo. E a rã pôde nadar sem o maiô. A mensagem é ainda mais forte porque Olga de Dios é absolutamente coerente em seu propósito. Dedicada a compartilhar conhecimento e consciência ambiental, adota uma licença creative commons para permitir o uso sem fins lucrativos de suas encantadoras obras — inclusive pensando no uso por educadores —, que podem ser baixadas gratuitamente em seu site.

Leitores um pouco mais velhos encontram, em Biodiversidade: tesouro real ou maldição tropical?, uma profusão de informações sobre ecologia, evolução e biodiversidade. O texto mais extenso, com um quê acadêmico, não se dirige aos bem pequenos e parece ter uma vocação paradidática por volta dos dez anos. Nurit Bensusan se define como uma bióloga que virou libélula por desgosto com sua espécie original, e mostra isso no esforço para demonstrar como a biodiversidade é uma riqueza, e não um empecilho ao desenvolvimento.

Sem fugir de assuntos complicados, ela consegue explicar temas complexos como evolução, origem da vida (e toda a trajetória ao longo dos milhões de anos, com sucessivas extinções), o que é biodiversidade e para que serve, e como isso tudo se relaciona com exclusão social. Enquanto brinca comparando insetos a super-heróis e mistura curiosidades, cultura pop, ciência e ambientalismo, Bensusan não busca uma opinião isenta (“…se você come bois e vacas, você devora a Amazônia e, de quebra, abocanha o Cerrado”) e chega a questões que dizem respeito diretamente ao leitor. Sem a polinização, que vem sendo perturbada por mudanças climáticas, a produção de alimentos e de chuvas fica incerta. Da biodiversidade dependem avanços em farmacologia, tecnologia, agricultura. Povos humanos estão integrados nela. 

A chave para evitar o desastre está em nos percebermos como parte da natureza e assim proteger a biodiversidade e usufruir de seus benefícios como de um tesouro. O livro é publicado pelo selo editorial Mil Folhas, do Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB), dedicado à divulgação de questões socioambientais.

Da biodiversidade dependem avanços em farmacologia, tecnologia e agricultura

Se requer alguma energia mergulhar na parte conceitual da ecologia, o puro encantamento está no Pequeno manual de peixes marinhos e outras maravilhas aquáticas, no qual se passeia livremente da contemplação à informação. Apaixonada pelo ambiente marinho, a artista plástica Beatriz Chachamovits desenha peixes rendilhados recheados de diversos seres marinhos — pequenos e grandes, estranhos e lindos, comuns e inusitados. A cada página virada, o leitor de qualquer idade é desafiado a procurar uma série de organismos entre os inúmeros que compõem o corpo do peixe. Também há, para os mais escolarizados, uma breve descrição da biologia da espécie em questão. 

No meio de informações precisas, há espaço para brincadeira. Descobrir qual dos peixes é inventado, pesquisar e escrever o texto sobre o peixe-ogro, desenhar o peixe-lanterna na página em branco. O resultado cativa desde bebês aos seus bisavós, uma obra de onde se sai com uma sensação de mergulho em um mundo misterioso. Porque explorar o fundo do mar é quase como fazer uma viagem espacial, de tanto desconhecido.

Fora da pauta eleitoral

Livros que ao mesmo tempo encantam e informam sobre ecologia são uma boa notícia neste momento em que a sustentabilidade é um problema crucial a ser enfrentado no mundo, e no entanto não faz parte das pautas discutidas em período eleitoral. 

Que crianças tenham contato com a biodiversidade, os danos dos excessos e a complexidade do funcionamento ecológico do mundo e possam se encantar com peixes marinhos, buscar soluções com o humor de uma rã de três olhos e investigar a teoria. Isso só pode produzir uma geração mais naturalmente consciente do que as anteriores, criadas em um mundo onde os recursos pareciam infinitos. E um futuro em que não se fale mais de ecochatos, por ser óbvia a necessidade de moderação e atenção. Talvez assim seja possível cuidar melhor de um planeta herdado em más condições.  

Quem escreveu esse texto

Maria Guimarães

Bióloga, escreveu Guia dos jardins de Roberto Burle Marx no Instituto Moreira Salles (IMS).

Matéria publicada na edição impressa #16 out.2018 em outubro de 2018.