Literatura infantojuvenil,

Leitores de carteirinha: abril de 2021

Jovens frequentadores de bibliotecas comunitárias resenham seus livros preferidos

01abr2021 | Edição #44

Julia Lacerda dos Santos, 17 – Guarulhos (SP)

Machado de Assis. Memórias póstumas de Brás Cubas.
Autêntica • 272 pp • R$ 34,90

Memórias póstumas de Brás Cubas foi o primeiro romance realista, um livro relativamente curto justamente pelo estilo muito objetivo de Machado de Assis. A obra se passa no Rio de Janeiro, no século 19, e é narrada por Brás Cubas, que se apresenta como um homem frio, algumas vezes fútil, talvez miserável. Ele nos traz o olhar do outro lado; por ser um “defunto autor”, não se importa com qualquer preceito social ou opinião alheia. Vê sua vida como se fosse um observador, e com essa leitura temos uma viagem por toda a existência de Brás, de uma forma não muito cronológica, sarcástica e cheia de opinião.

Ele conta sobre suas escolhas, experiências e ações, avalia os amigos e os familiares e revela um ponto de vista hipócrita e desiludido. Em certo ponto da história, Brás conhece uma moça chamada Eugênia e a despreza por ser manca. Isso me marcou pois mostra sua face volúvel e que se importa muito mais com as aparências do que com caráter e índole.

Sair por cima

Na juventude, se envolve com Virgília, filha de um político, mas ela escolhe se casar com o rico Lobo Neves, o que abala Brás. Ele a julga interesseira, mas, como leitora, tenho a percepção de um caráter duvidoso de Brás, sendo mais fácil apontar o erro de Virgília do que reconhecer as causas da escolha dela. É interessante como, mesmo sendo isento de julgamentos (por estar morto), ele sente a necessidade de justificar algumas ações e “sair por cima” em algumas situações.

No final do livro temos a sua declaração mais marcante: “Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria”, que mostra muito sobre sua personalidade difícil e sobre seu senso de superioridade.

Rian dos Santos Passos, 17 – Paraty (RJ)

Jennifer Niven. Por lugares incríveis.
Tradução de Alexandra Esteche
Seguinte • 336 pp • R$ 34,90

Por lugares incríveis, escrito por Jennifer Niven, conta a história de Violet Markey, uma jovem loira presa numa bolha de proteção, e Theodore Finch, chamado de “aberração”. Eles se encontram no dia em que Violet decide tirar sua própria vida. Finch a salva, impedindo que ela se jogue de uma ponte. Então, começa a jornada desse casal. Violet, que perdeu sua irmã mais velha, Eleanor, por causa de um acidente de carro, tem problemas em superar a sua perda. Finch, por sua vez, tem problemas familiares, uma vida de zombaria e sua mente inexplicável.

O livro traz um garoto que, apesar de ter problemas, abre mão de tudo para ajudar outra pessoa

Os dois se transformam numa dupla para fazer um trabalho escolar de geografia, em que percorrem atrações turísticas de Indiana. Durante o trajeto, eles se apaixonam. Ambos se sentiam bem quando estavam juntos, porém, durante uma discussão com Violet, Finch entra em crise e some sem dar notícias. Passados muitos dias do sumiço dele, sua mãe entra em contato com Violet, desesperada, procurando por seu filho. Começa uma busca por Finch, e Violet o encontra.

Gostei bastante do livro por ter um garoto que não sabe lidar com seus próprios problemas, mas abre mão de tudo para ajudar outra pessoa. E agora penso mais nas outras pessoas, lembro que não sou só eu que passo por momentos difíceis.

Maraia K. Oliveira de Brites, 17 – Porto Alegre (RS)

Mia Couto. Antes de nascer o mundo.
Companhia das Letras • 277 pp • R$ 54,90

Nessa obra singela e cativante, vemos retratada a história de uma família que vive isolada na Moçambique do pós-guerra. Um pai viúvo leva seus dois filhos para morar em um lugar esquecido por Deus e pela civilização. Na companhia dos devaneios do amargurado e autoritário pai, Silvestre Vitalício, das revoltas e insatisfações do irmão mais velho Ntunzi e das memórias de guerra e caça de um amigo do pai, a história é contada por Mwanito, menino inocente e amável, afinador de silêncios, que tenta desvendar a existência e seus mistérios, naquele lugar de poucas respostas.

Dor

Sua única ligação com o mundo exterior é o Tio Aproximado, irmão da falecida mãe, que os visita de tempos em tempos. A perda da mãe é uma dor que acompanha os irmãos, mas principalmente Mwanito, por não ter tido a oportunidade de conhecê-la. Dor essa que atormenta seu pai, que, incapaz de suportá-la, precisou mudar de nome e criar seu próprio mundo (onde não sentisse culpa pela morte de Dordalma).

O livro nos transporta ao pequeno universo da família, onde experienciamos o luto, o vazio da solidão, a raiva de Ntunzi para com seu pai, a mágoa e a reflexão acerca da dureza dos homens do mundo moderno. A obra nos obriga a questionar até onde as pessoas podem ir tomadas pela frustração. Mia Couto nos mostra a visão que a sociedade tinha das mulheres, demonizadas e fragilizadas, como se valessem pouco. Muito disso se vê nas falas de Silvestre proferidas à mãe de seus filhos. Acompanhamos a transgressão do isolamento da família, as primeiras descobertas dos meninos, as tentativas de contato com o “mundo real” e a ansiosa volta à civilização.

Este texto foi feito com apoio do Itaú Social.

Quem escreveu esse texto

Julia Lacerda dos Santos

Estuda em Guarulhos (SP).

Rian dos Santos Passos

Estuda em Paraty (RJ).

Maraia K. Oliveira de Brites

Estuda em Porto Alegre (RS).

Matéria publicada na edição impressa #44 em março de 2021.