(Divulgação)

Crítica Literária, Memória,

Morre aos 85 anos Heloisa Teixeira, uma das principais intelectuais e feministas do país

Imortal da Academia Brasileira de Letras, escritora se descrevia como “antecipadora de tendências” e foi uma patrona da poesia marginal

28mar2025 • Atualizado em: 31mar2025

Heloisa Teixeira, uma das maiores intelectuais dos estudos de cultura, produção marginal e relações de gênero do país, morreu nesta sexta-feira (28), aos 85 anos. Ocupante da cadeira número 30 da Academia Brasileira de Letras desde 2023, a escritora e professora emérita da Universidade Federal do Rio de Janeiro estava internada para tratamento de uma pneumonia, segundo a ABL. O velório será neste sábado (29), na sede da entidade.

Décima mulher eleita pela ABL entre mais de trezentos homens, a acadêmica se definia como “uma antecipadora de tendências”. Seus estudos marcam iniciativas como a antologia 26 poetas hoje, de 1976 (reeditada em 2021 pela Companhia das Letras), que revelou a poesia de Ana Cristina Cesar, Cacaso e Chacal; a Universidade das Quebradas, projeto de extensão lançado em 2009 para destacar o conhecimento periférico; e a Coleção Pensamento Feminista (Bazar do Tempo, 2019-20), síntese da teoria de gênero dos últimos cinquenta anos.

“Minha profissão é dar voz aos outros. Faço a mediação. É assim que trabalho, crio e penso. Tenho dificuldade em me definir como protagonista. Eu estava ali. Era amiga. Na geração de 60, tinha festa, passeata e praia. Eram as três arenas políticas da esquerda festiva, que era chamada assim porque, em vez de fazer guerrilha, de ir à luta de fato, ficava na praia, dizendo que estava revolucionando”, descreveu ela em entrevista a Adriana Ferreira Silva há um ano, na Quatro Cinco Um.

Na ocasião, a intelectual falou sobre a juventude das décadas de 60, 70 e 80, analisou os movimentos artísticos de vanguarda durante a ditadura militar e contou que tinha mais quatro livros para 2025 e 2026. Em Rebeldes e marginais: cultura nos anos de chumbo (1960-1970) (Bazar do Tempo, 2024), sua publicação mais recente, Teixeira analisa a produção dos jovens artistas brasileiros a partir da década de 60, aprofundando a gênese de movimentos como o Cinema Novo, Cinema Marginal, Tropicalismo, Teatro Oficina, o happening nas artes plásticas e aquilo que ela denominou como “esquerda festiva”.

O livro contém um QR Code com entrevistas que a autora fez com José Celso Martinez Corrêa, Antônio Dias, Hamilton Vaz Pereira, Carlos Lyra, Gilberto Gil, Cacá Diegues e outros importantes artistas e intelectuais com quem conviveu. Foi também o primeiro que ela resolveu assinar como Heloisa Teixeira, abandonando o Buarque de Hollanda — sobrenome do primeiro marido, de quem havia se separado nos anos 60.

Minha profissão é dar voz aos outros. Faço a mediação. É assim que trabalho, crio e penso.

Para além dos livros, a pesquisadora buscou estimular ao máximo o intercâmbio entre a comunidade acadêmica e a produção cultural de povos marginalizados, por meio da coordenação de projetos como o Universidade das Quebradas e o Laboratório da Palavra, da UFRJ.

Em 2023, sua trajetória virou o documentário Helô, dirigido por seu primogênito, Lula Buarque de Hollanda. O filme narra o percurso de Heloisa desde a juventude até a posse na Academia Brasileira de Letras (ABL), e tenta acompanhar a intelectual, sempre alguns passos à frente e disposta a seguir produzindo mais do que nunca. Revela ainda seu lado irreverente, já na abertura, quando a própria acrescenta o adjetivo “biscateira” a uma tentativa de tentar definir suas muitas atividades.