Listão da Semana,

Algoritmos da opressão e mais 6 lançamentos

Safiya Umoja Noble expõe como os mecanismos de busca na internet são tendenciosos e descriminam pessoas negras

22out2021 | Edição #50

Procurando inspiração para entreter suas jovens sobrinhas, Safiya Umoja Noble pesquisou “garotas negras” no Google. Em vez de resultados sobre áreas de interesse para as meninas, recebeu uma página repleta de pornografia. O episódio levou-a à pesquisa que deu origem a Algoritmos da opressão, que chega nesta semana às livrarias brasileiras. Nele, a autora expõe como os mecanismos de busca na internet são tendenciosos e descriminam pessoas negras, sobretudo mulheres.

Completam a seleção da semana os últimos escritos de István Mészáros, uma antologia brasileira de contos de horror, a história da execução de quatro militantes revolucionários durante a ditadura, uma biografia do fotógrafo Mario Baldi, uma análise da cultura da violência no Brasil e o novo romance de Marana Borges.

Viva o livro brasileiro!

Algoritmos da opressão: como os mecanismos de busca reforçam o racismo. Safiya Umoja Noble.
Trad. Felipe Damorim • Rua do Sabão • 414 pp•  R$ 45

Por meio de análises de texto e mídia e de uma extensa pesquisa sobre publicidade on-line, Safiya Umoja Noble mostra que as fórmulas algorítmicas que regem os resultados das buscas reproduzem e fortalecem uma sociedade racista e machista, pois os algoritmos são definidos por pessoas que promovem abertamente o racismo, o sexismo e outras formas de preconceito. A autora apresenta os resultados de buscas para uma variedade de identidades que incluem “meninas negras”, “latinas” e “meninas asiáticas”, e de como os interesses de marketing e de publicidade afetam o ranqueamento de páginas do Google. Noble é professora associada da Universidade da Califórnia em Los Angeles e pesquisadora associada do Oxford Internet Institute. Em 2020, foi indicada para o Conselho do Futuro Global de Inteligência Artificial para a Humanidade do Fórum Econômico Mundial.

Trecho do livro: “Parte do desafio de compreender a opressão algorítmica é perceber que as formulações matemáticas que guiam as decisões automatizadas são feitas por seres humanos. Embora frequentemente pensemos em termos como ‘big data’ e ‘algoritmos’ como sendo benignos, neutros ou objetivos, eles são tudo menos isso. As pessoas que definem essas decisões detêm todos os tipos de valores, muitos dos quais promovendo abertamente racismo, sexismo e noções falsas de meritocracia, o que está bem documentado em estudos sobre o Vale do Silício e outros corredores de tecnologia.”

Leia também: Quando as pessoas tiverem o próprio assistente virtual, seremos confrontados com vários problemas éticos.

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Para além do Leviatã: crítica do Estado. István Mészáros.
Trad. Nélio Schneider • Boitempo • Intr. John Bellamy Foster • 512 pp • R$ 83

A última grande obra do pensador húngaro István Mészáros (um dos principais discípulos de György Lukács) ocupou os últimos quinze anos de sua vida e restou inacabada quando ele morreu, em 2017. Dos três volumes planejados, apenas este primeiro foi parcialmente concluído. O livro encerra uma crítica radical do Estado, no qual expõe a natureza do poder político, a crise estrutural do capitalismo, o fim da política liberal democrática e a falência dos Estados-Leviatã. Ele sustenta que as crises ambientais e militares provocadas pelos Estados podem destruir o planeta se a sociedade não encontrar um modo alternativo de se organizar e de se relacionar com a natureza. A primeira edição mundial sai em português conforme desejo expresso pelo autor em vida.

Leia também: O que as biografias de Marx e Engels esclarecem não só sobre o momento em que suas ideias nasceram, mas também o presente.

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O novo horror. Daniel Gruber e Irka Barrios.
Pref. Antônio Xerxenesky • O Grifo Editora • 218 pp • R$ a definir

A antologia reúne dezoito contos de horror de autores de diversas regiões, entre eles Daniel Galera, Bruno Ribeiro, Cláudia Lemes, José Francisco Botelho, Gustavo Czekster, Larissa Prado, Nikelen Witter, Rodrigo Tavares, Matheus Borges, Ismael Chaves e outros. O livro traz narrativas do chamado “pós-horror”, com textos politicamente engajados sobre xenofobia, racismo, fanatismo religioso e feminicídio, ao lado de tramas mais tradicionais com psicopatas e medos sobrenaturais.

Leia também: Lançamentos de autoras do México e da Bolívia exploram problemas sociais e raciais por meio da literatura de horror.

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Injustiçados: execuções de militantes nos tribunais revolucionários durante a ditadura. Lucas Ferraz.
Companhia das Letras • 256 pp • R$ 69,90

Com base em documentos, cartas e depoimentos, o jornalista mineiro Lucas Ferraz descreve as execuções de quatro militantes de grupos de esquerda (Márcio Toledo, Carlos Alberto Cardoso, Francisco Alvarenga e Salatiel Rolim) que foram injustamente considerados traidores do movimento revolucionário durante a ditadura militar e executados pelos seus companheiros a partir de 1971, período em que a guerrilha estava em franco declínio e infiltrada pelos serviços secretos do regime.

Ouça também:  Podcast 451 MHz dedica episódio às vítimas da ditadura brasileira.

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Mario Baldi, o photoreporter do Brasil: uma história sobre fotografias, narrativas e mediação cultural. Marcos de Brum Lopes.
Apres. Ana Maria Mauad • Letra e Voz • 328 pp • R$ 50

Historiador do Museu Casa de Benjamin Constant, Marcos de Brum Lopes dedicou seu mestrado e seu doutorado à obra do fotógrafo austríaco Mario Baldi, que atuou no Brasil de 1921 a 1957 e cuja trajetória profissional foi marcada pela fotografia etnográfica e jornalística. Em sua longa carreira, ele acabou se envolvendo com personagens tão contrastantes como os descendentes da família Imperial brasileira e os povos indígenas do país. O livro mostra como um mediador cultural na cena pública (o sujeito-fotógrafo) se aproxima de seus temas, mas também revela como seus temas (os sujeitos-fotografados) se apresentam do fotógrafo e dos contempladores.

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A vida nunca mais será a mesma: cultura da violência e estupro no Brasil. Adriana Negreiros.
Objetiva/Companhia das Letras • 304 pp • R$ 49,90

Ex-editora da revista Claudia, Adriana Negreiros analisa a cultura da violência contra a mulher no Brasil em suas diferentes modalidades e expressões no período que vai de 1994 (ano da Convenção de Belém do Pará, destinada a prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher) a 2014, ano da histórica campanha “Eu não mereço ser estuprada”. A partir de sua própria dramática experiência pessoal e de relatos de outras mulheres, ela estuda a naturalização da violência sexual no país, o abuso sexual de crianças por familiares e o estupro no casamento, entre outros temas.

Ouça também: No podcast 451 MHz,  Tatiana Salem Levy e Paloma Franca Amorim conversam sobre as representações literárias da violência sexual.

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Mobiliário para uma fuga em março. Marana Borges.
Dublinense • 400 pp • R$ 64,90/39,90

Ganhador do prêmio Minas Gerais de Literatura, este romance poético descreve uma família em desagregação. A partir dos objetos de sua casa, a narradora fala de seu pai ausente (“Ninguém me pergunta por ele. Meu pai. Homem inexistente ou que fugiu a tempo”), da mãe dominadora (“Uma mãe é manancial demais”) e dos sentimentos ambíguos com seu irmão (“Visto uma camiseta branca e saia de sarja. Ela diz que estou a mostrar as pernas ao meu irmão. Ela diz: “Para de se insinuar”).

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Quem escreveu esse texto

Marília Kodic

Jornalista e tradutora, é co-autora de Moda ilustrada (Luste).

Mauricio Puls

É autor de Arquitetura e filosofia (Annablume) e O significado da pintura abstrata (Perspectiva), e editor-assistente da Quatro Cinco Um.

Matéria publicada na edição impressa #50 em outubro de 2021.