Festival literário,

Na Fliquinha, a literatura para crianças começa com bananas

Espaço para o público infantojuvenil na Flica, a Festa Literária Internacional de Cachoeira (BA), juntou contação de histórias afro-indígenas, teatro infantil e apresentação de capoeira

31out2023

Paula Anias, professora e escritora, convidou seis crianças ao palco da Fliquinha e entregou uma banana para cada. Em seguida, começou a contar a história de uma menina que encontrou a semente crioula em uma banana, e assim tornou-se a guardiã de todas as sementes. Na história, ela é abençoada pelo espírito de uma anciã indígena, que guardava o segredo das sementes crioulas — como são chamadas as sementes nativas tradicionalmente protegidas por comunidades indígenas e quilombolas.

As crianças então foram convidadas a também procurar sementes enquanto comiam as bananas recebidas na última sexta-feira (27) no espaço infantojuvenil da 11ª Flica, a Festa Literária Internacional de Cachoeira.

Em todos os dias da festa, que terminou no domingo (29), a Fliquinha teve uma programação própria sediada no auditório da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, com contação de histórias e intervenções artísticas. Imagens e animações coloridas estampavam as paredes, e o palco era redecorado a cada nova atividade. Entre uma atração e outra, crianças aguardavam na brinquedoteca, onde pintavam e se esbaldavam num escorregador. 

“Procuramos trazer escritores, escritoras e espetáculos que falassem diretamente desse lugar afro-indigena”, contou Clara Amorim, educadora e curadora da Fliquinha, remetendo ao tema desta edição da Flica: “Poéticas afro-indígenas da brasilidade no bicentenário da Independência do Brasil na Bahia”. A curadoria infantojuvenil destacou uma literatura que valorizasse a estética dos povos negros e indígenas, para que as crianças se reconhecessem no espaço e nas histórias contadas.

No total, a programação da Fliquinha teve 24 atrações. Entre elas, o grupo Capoeira Abalou Cachoeira, o grupo de dança Raízes do Ébano, a Escolinha de Música da Lira Ceciliana, saraus literários e apresentações teatrais como a da Companhia de Teatro Griô, que montou o espetáculo Yalodê, inspirado em histórias e mitos africanos.

A atriz Luciana Souza, dos filmes Ó, paí, ó (2007) e Bacurau (2009), apresentou Três monólogos e solitudes, história que mostra, através do humor, os desafios enfrentados por professores em sala de aula. O racismo religioso e o machismo foram os principais temas do espetáculo, que tocou não só as crianças, mas pais e professores convidados a compartilhar suas experiências. 

A plateia da Fliquinha era formada por estudantes de escolas públicas e privadas do Recôncavo Baiano, junto com professores e pais que os acompanhavam. Além de ouvir histórias contadas por artistas e educadores, as crianças foram convidadas ao palco para compartilhar suas próprias histórias, recitar poemas, cantar e brincar de trava-línguas. 

Segundo Amorim, é na primeira infância que os pequenos devem ter contato com experiências que abordam problemas como racismo, violência e intolerância. A Fliquinha foi um ambiente para debater essas e outras questões. “É imprescindível [esse debate] para que a gente tenha um país com menos desigualdades, menos agressão, sobretudo às populações negras e indígenas”, disse a curadora.

Quem escreveu esse texto

Luana Miranda