A Feira do Livro, Meio ambiente,
Origem e destino
Em novo livro, Ailton Krenak e Yussef Campos propõem um enfrentamento das culturas hegemônicas no planeta
10jun2022 | Edição #58Em 2013, o historiador e professor da Universidade Federal de Goiás Yussef Campos entrevistou Ailton Krenak para sua tese de doutorado. Essa conversa, que extrapolou o tema da tese (conceito de patrimônimo cultural e a Constituição de 1988) para questões sobre a vida no planeta, resultou em Lugares de origem (Jandaíra).
Campos, que hoje às 10h se reúne com Krenak para conversar com o público no Palco da Praça d’A Feira do Livro, conta a seguir um pouco sobre o novo livro e a luta pelos direitos dos povos indígenas.
O que são lugares de origem?
O título do livro é parte de uma fala de Ailton. Eu não quero adiantar muito para manter a curiosidade do leitor, mas é uma conversa na qual ele fala que a relação com a ancestralidade é também uma relação com a terra, que pode ser múltipla: o nosso lugar de origem não é necessariamente um só. Podemos pensar sob uma perspectiva temporal cíclica, não linear. A gente pode recomeçar o tempo todo em lugares distintos e retomar essa origem o tempo todo.
Os lugares de origem ajudam a enxergar melhores lugares de futuro?
Acho que sim, desde que a gente decolonize nosso pensamento e aprenda com as etnias indígenas, com os povos da floresta, a perceber a nossa participação no mundo, a perceber quão absurdo é dividirmos nossa vida entre cidade e natureza, como se a cidade também não fosse natureza, ainda que reconstruída. Enfim, se abrirmos nossos ouvidos mais para quem está ao nosso lado e menos para quem está em outro hemisfério e quer da gente somente as commodities.
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Quase 35 anos depois da Assembleia Constituinte, quais foram, na sua opinão, os avanços e retrocessos em relação à questão indígena?
Se houve avanços, e houve, foi por causa da Constituição. Há um capítulo específico sobre direitos indígenas, entre eles garantir a demarcação das terras. O que vejo de retrocesso, hoje, são aqueles projetos vencidos pelas bancadas ruralistas, que tentam trazer para si a competência da demarcação da terra indígena — por exemplo, que querem botar a raposa para tomar conta do galinheiro. Os latifúndios estão todos dentro do Congresso, representados direta ou indiretamente.
A gente não precisa de uma outra Constituição, a atual já prevê os instrumentos para suprir as lacunas que porventura surjam. A vida em sociedade e a cultura são dinâmicas, mas o direito não. Para tentarmos suprir essa falta de dinamismo do direito, temos as propostas de emendas à Constituição. Porém, essas emendas precisam ser progressistas, para que esses grupos sempre colocados à margem, como os indígenas, os quilombolas, possam sobreviver. Falar sobre a sobrevivência da cultura indígena é um segundo passo: a gente precisa primeiro garantir a sobrevivência dos próprios indígenas.
Matéria publicada na edição impressa #58 em junho de 2022.
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