Repertório 451 MHz,
A voz e o silêncio de Clarice Lispector — parte 2
A autora de ‘A paixão segundo G. H.’ comenta como o inconsciente adentrou sua escrita e fala sobre sua atividade como tradutora na segunda parte da entrevista feita em 1976
28jul2023Ouça mais Episódios
Está no ar o 92º episódio do 451 MHz, o podcast da revista dos livros. Seguindo as comemorações dos quatro anos do podcast, publicamos a segunda parte da conversa com Clarice Lispector. A entrevista foi feita em outubro de 1976 pelos escritores Marina Colasanti, Affonso Romano de Sant’Anna e João Salgueiro para o MIS (Museu da Imagem e do Som) do Rio de Janeiro. O áudio foi restaurado e disponibilizado pela revista The New Yorker com participação de Benjamin Moser, biógrafo de Lispector. Dessa vez, a autora de A paixão segundo G. H. comenta como o inconsciente adentrou sua escrita e fala da sua atividade como tradutora. Em seguida, Benjamin Moser e Mariana Delfini continuam falando sobre os bastidores desse encontro histórico.
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Um tesouro nacional
A entrevista de Clarice Lispector veiculada neste episódio foi feita em outubro de 1976 pelos escritores Marina Colasanti, Affonso Romano de Sant’Anna e João Salgueiro para o programa Depoimentos para a Posteridade do Museu da Imagem e do Som (MIS) do Rio de Janeiro. Esse registro faz parte do acervo cultural brasileiro e com a publicação o 451 MHz cumpre uma de suas missões, de ampliar o acesso a material histórico.
A escritora Clarice Lispector, em 1968. (Arquivo Nacional/Fundo Correio da Manhã/Reprodução)
A existência desse áudio era conhecida, mas ele não estava disponível em boa qualidade técnica. Com a anuência da família de Lispector, o áudio foi entregue a Benjamin Moser, biógrafo da escritora, e então restaurado e publicado pela revista The New Yorker.
A transcrição da entrevista já havia sido publicada pela editora Rocco no livro Outros escritos, mas é a primeira vez que é possível ouvi-la na íntegra, sem cortes. A edição de agosto da Quatro Cinco Um também trará uma transcrição mais abrangente dessa conversa, junto com apontamentos de Benjamin Moser.
A entrevista foi dividida em dois episódios. A primeira parte do áudio pode ser ouvida no seu tocador preferido ou logo abaixo:
Neste segundo episódio, Lispector comenta como o inconsciente adentrou sua escrita e fala da sua atividade como tradutora, da qual não gostava. Do mesmo modo, não lhe agradava a vida como mulher de diplomata, na qual tinha que organizar jantares e participar de eventos oficiais. Foi nesse ambiente que A maçã no escuro foi escrito — na conversa, ela comenta como esse era um dos seus livros preferidos na época.
Quando perguntada se ainda gostava de Laços de família, ela responde que está enjoada dele. Outras obras suas citadas na entrevista são Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres (que virou filme nas mãos de Marcela Lordy)
Sobre autores que a influenciaram, ela revelou que dois dos livros mais marcantes da sua vida foram Crime e castigo, de Dostoiévski, e O lobo da estepe, de Hermann Hesse, cuja leitura a deixou febril.
Conversa entre amigos
Um dos aspectos que mais chamam a atenção é o tom descontraído da entrevista, com uma Lispector mais solta, falante e relaxada. Há poucos registros em áudio e vídeo da autora, sendo que a entrevista que ela concedeu para a TV Cultura em 1977, meses antes de morrer, era a única em ampla circulação. Inclusive, está disponível no YouTube:
A diferença de tom entre um registro e outro pode ser por causa dos entrevistadores. Na conversa para o MIS, além de João Salgueiro, estão os escritores Marina Colasanti e Affonso Romano de Sant’Anna, grandes amigos de Lispector.
Essa característica é apontada na conversa entre Benjamin Moser, autor de Clarice, biografia da autora lançada em 2009, e Mariana Delfini, editora da Tinta-da-China Brasil e uma grande admiradora de Lispector. Os dois explicam o contexto dessa entrevista do MIS na segunda parte do episódio, que sucede a conversa de Clarice com seus amigos.
Moser também comenta da importância desse áudio ter sido publicado na New Yorker, especialmente para a visibilidade internacional de um dos grandes nomes da literatura brasileira. Com isso, Clarice Lispector já entrou para o cânone literário mundial.
No ano passado, ele também publicou um texto na Quatro Cinco Um sobre como a editora ucraniana da escritora, Anetta Antonenko, resistiu à invasão russa com seus livros, seus gatos, sua língua e sua arma. Moser já havia participado do episódio 10 do podcast falando sobre sua biografia de Susan Sontag.
Mariana Delfini é uma grande leitora de Clarice Lispector e publicou dois textos sobre a autora na revista Quatro Cinco Um: o primeiro sobre o livro Todas as cartas, lançado em 2020 e que abrange grande parte da correspondência da autora, e o segundo sobre o processo de criação de A hora da estrela a partir dos seus manuscritos.
Mais Clarice na Quatro Cinco Um
Lispector foi capa da edição 21 da revista dos livros com um ensaio fotográfico feito por Claudia Andujar e texto de Thyago Nogueira.
Marise Hansen falou dos laços que unem Lispector a Carolina Maria de Jesus a partir dos vazios e as subjetividades de Laços de família e Quarto de despejo sessenta anos depois de seu lançamento.
A produção infantil de Clarice Lispector foi tema de dois textos publicados na revista: “Os relevos acidentados das emoções”, assinado por Moacyr Godoy Moreira, uma resenha do livro As crianças de Clarice, de Mell Brites; e “A personalidade das flores”, em que Cristiane Tavares escreve sobre De natura florum, que traz 24 verbetes nos quais Lispector descreve variadas espécies de flores.
Spoiler A edição de agosto da Quatro Cinco Um trará um texto de Benjamin Moser sobre a entrevista e a transcrição da gravação, além de um relato de Paulo Valente Gurgel, filho de Clarice, e uma releitura da protagonista de A hora da estrela por Conceição Evaristo. Assine agora para receber a Clarice em casa.