A cobertura especial d’A Feira do Livro, que acontece de 14 a 22 de junho, é apresentada pelo Ministério da Cultura e pela Petrobras
MINISTÉRIO DA CULTURA E PETROBRAS APRESENTAM


A FEIRA DO LIVRO 2025,
Para Marina Berri e Bruno Gomide, mundo precisa se ‘realfabetizar’ sobre a Rússia
Autora argentina e professor da USP falam sobre paixão pelo idioma russo e impacto da guerra com a Ucrânia para estudiosos da literatura russa
14jun2025 • Atualizado em: 20jun2025Em uma conversa sobre a paixão que compartilham pela língua, a literatura e a cultura da Rússia, a linguista argentina Marina Berri e o professor de literatura e cultura russa da USP Bruno Gomide defenderam neste sábado (14) que o momento atual de guerra com a Ucrânia, em que a Rússia praticamente cortou suas trocas culturais com boa parte do Ocidente, deve ser encarado como uma oportunidade para uma “realfabetização” do mundo na cultura russa.
O encontro, que aconteceu n’A Feira do Livro, na mesa Alfabeto russo, foi mediado pela pesquisadora da língua e da cultura russa Marina Darmaros e teve tradução simultânea de Lucien Beraha e Ramon de Barros. A mesa levou o nome do novo livro de Berri recém-publicado no Brasil, Alfabeto russo: cenas de língua e cultura (Fósforo), em que ela cria pequenos ensaios sobre aspectos pouco conhecidos da cultura russa partindo de verbetes iniciados com as 33 letras do alfabeto do país.
Berri e Gomide, autor de livros de referência sobre a influência da literatura russa na cultura brasileira — como Antologia do pensamento crítico russo (Editora 34, 2013) e Da estepe à caatinga: o romance russo no Brasil (1887-1936) (Edusp, 2011) —, disseram que a guerra impactou decisivamente sua relação com a Rússia. O conflito, por exemplo, praticamente paralisou viagens de estudos ao país, tanto por questão de segurança quanto pelo congelamento de parcerias com universidades americanas e europeias.
“A guerra significou mudar totalmente minha relação com a Rússia. Para mim a Rússia é algo incancelável, ela faz parte de mim, mas agora fico nessa pausa”, disse Berri. A escritora falou ainda sobre como a invasão russa da Ucrânia afetou seu círculo pessoal de amigos, muitos deles imigrantes russófonos que foram viver na Argentina depois do início do conflito — assunto sobre o qual ela tratou em entrevista para a Quatro Cinco Um.
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“A relação da Rússia com o Norte Global foi praticamente extinta. Aqui [no Brasil] a situação é um pouco distinta, porque a Rússia investe nas relações com o Sul Global. Do ponto de vista editorial continua havendo interesse, a literatura russa continua sendo publicada e traduzida”, disse Gomide.
Língua e cultura
Questionados pela mediadora Marina Darmaros sobre as razões que os levaram a se dedicar ao idioma russo, às vezes considerado “árduo” e de difícil tradução, Berri e Gomide responderam que tudo começou com a paixão pelos autores russos.
“Para mim, entender russo significou me aproximar da cultura e da literatura russa de uma forma mais profunda”, explicou a argentina, acrescentando que em Alfabeto russo ela tentou mostrar “alguma coisa [da cultura russa] que só seria acessível a pessoas que entendiam russo”.
De fato, o livro apresenta facetas da língua e da cultura da Rússia pouco conhecidas por estrangeiros, como desenhos animados populares no país, lugares peculiares de cidades e grandes autores russos nem sempre lembrados, como a contemporânea Maria Stepánova, de Em memória da memória (Poente, 2024).
Aproveitando a deixa, Gomide disse considerar que na conjuntura atual — de guerra e grande tensão geopolítica — é bom que qualquer pessoa que se interesse pelo país de Vladimir Putin possa se “realfabetizar” na cultura russa, abandonando alguns estereótipos. “O livro de Marina Berri [Alfabeto russo] tem um olhar ‘desautomatizador’, que olha como se fosse a primeira vez, um olhar de criança.”
Fugir de Dostoiévski
Um clichê, por exemplo, é a ideia de que na Rússia os escritores clássicos mais conhecidos são Dostoiévski, Tolstói ou Tchekhov — que são referenciais, é claro, mas em popularidade ficam atrás de autores como Púshkin, o “poeta nacional” da Rússia, Boris Pasternak ou Serguei Iessienin.
A propósito disso, Marina Berri evitou criar na letra “d” um verbete nomeado Dostoiévski, e também não contemplou Tolstói nem Tchékhov. “São autores que as pessoas conhecem. Tentei falar deles de maneira lateral, por exemplo, [lembrando] Tolstoi ao falar dos diários dele, que são menos conhecidos na Argentina”, disse.
Seguindo esse método, Berri volta-se para facetas da cultura russa divertidas e fascinantes, como a popularidade de podcasts de detetives e um Facebook fake com postagens e perfis de figuras históricas que relatam episódios da Revolução Russa.
Ao fim, Bruno Gomide ressaltou que, ao falarmos de literatura russa, é útil lembrar que há autores e autoras escrevendo em russo em outros países russófonos, como a Letônia, sem esquecer dos pesquisadores espalhados por universidades ao redor do mundo. “A literatura russa não existe só na Rússia”, disse.
A quarta edição d’A Feira do Livro 2025 acontece de 14 a 22 de junho, na praça Charles Miller, no Pacaembu. Realizado pela Associação Quatro Cinco Um, pela Maré Produções e pelo Ministério da Cultura, o festival literário paulistano, a céu aberto e gratuito, reúne mais de duzentos autores e autoras do Brasil e do exterior em uma programação com mais de 250 atividades, entre debates, oficinas, contações de histórias e encontros literários. Confira a programação e outras notícias do festival.
A Feira do Livro
14 a 22 de junho de 2025
Praça Charles Miller – Pacaembu – São Paulo/SP
Entrada gratuita
A Feira do Livro 2025 · 14 — 22 jun. Praça Charles Miller, Pacaembu
A Feira do Livro é uma realização do Ministério da Cultura, por meio da Lei Rouanet – Incentivo a Projetos Culturais, Associação Quatro Cinco Um, organização sem fins lucrativos dedicada à difusão do livro e da leitura no Brasil, Maré Produções, empresa especializada em exposições e feiras culturais, e em parceria com a Prefeitura de São Paulo.
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