
A cobertura especial d’A Feira do Livro, que acontece de 14 a 22 de junho, é apresentada pelo Ministério da Cultura e pela Petrobras
MINISTÉRIO DA CULTURA E PETROBRAS APRESENTAM


A FEIRA DO LIVRO 2025,
Emancipação negra é o tempo todo colocada em xeque, diz Lázaro Ramos
Ator conversou sobre importância da arte e da religião para luta antirracista com o teólogo Ronilso Pacheco em uma das mesas mais cheias d’A Feira do Livro
22jun2025Qual é o papel da arte e da religião na luta pela igualdade racial? A questão permeou uma conversa entre o ator, diretor e escritor Lázaro Ramos e o teólogo Ronilso Pacheco neste domingo (22), em uma das mesas mais cheias desta edição d’A Feira do Livro, com mediação da jornalista e escritora Adriana Ferreira Silva.
Ramos, que lançou recentemente Na nossa pele: continuando a conversa, sequência de seu best-seller Na minha pele, ambos publicados pela Objetiva, disse acreditar profundamente na arte e no seu poder de abrir portas. Mas, prosseguiu, ela não é capaz de transformar a realidade sozinha.

Assim, se é verdade que a arte vem conseguindo chamar a atenção para questões raciais fundamentais, como a representatividade, ela também lida com um mundo que parece querer pôr a emancipação negra o tempo inteiro em xeque.
“Vejo que os dados de assassinatos de jovens negros permanecem aumentando, e isso impede que eu me emancipe. Quando penso que chegou o momento em que vamos conseguir debater alguns assuntos, ampliá-los, vêm movimentos que chamam o que estamos fazendo de identitarismo, numa tentativa de silenciar uma discussão importantíssima para o desenvolvimento do nosso país. Isso atrapalha a emancipação”, afirmou.
Isso sem falar de ameaças da tecnologia que atingem as pessoas mais vulneráveis. Ele mencionou o impacto da inteligência artificial (IA) no mercado de trabalho e o dano que filtros embelezadores das redes sociais podem ter para autoestima dos jovens. “Esta é uma época que me provoca mais agonia do que inspiração”, desabafou.
Revolução e religião
Pacheco, por sua vez, comentou a questão que guia as suas pesquisas, a religião. Ele afirmou que, seja na África do século 18, nas Américas da época colonial ou nos Estados Unidos de hoje, as revoluções sociais negras são indissociáveis da religião — diferentemente do que ocorreu, por exemplo, na Europa, que já abrigou movimentos relevantes de matriz secular
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Daí seu esforço para trazer a teologia negra, nome de seu livro homônimo publicado pela Zahar, para o centro do debate. O volume busca oferecer uma introdução a essas teorias aos leitores brasileiros com o objetivo de mostrar como muitos movimentos radicais de resistência e combate racial se inspiraram na Bíblia.
Os convidados da mesa ressaltaram a importância de escrever para um público mais amplo, que inclua comunidade negra brasileira, mas não se limite a ela. Ramos contou que desenvolveu um método narrativo com esse objetivo, chamado de “poética do acolhimento estratégico” e detalhado em Na nossa pele.
Nele, inicia-se o diálogo com o leitor ou o espectador tratando de assuntos em comum, como família e trabalho, e reforça-se a identificação com ele ao apelar ao humor e à emoção. É só depois dessa etapa que a narrativa passa a falar de temas como raça e desigualdade.
“É uma estratégia que não sei se vou usar para sempre. Mas não acho que escrevo livros para se tornarem clássicos. Escrevo-os para hoje, para melhorar o hoje, para dialogar com as nossas questões hoje”, disse.
“Se houver [a palavra] negro no meio [de um título], a grande maioria das pessoas acha que o assunto [da obra] é restrito a pessoas negras. Acho que um pouco do que tenho tentado fazer é promover o entendimento de que o que escrevo, o que eu produzo, não é única e exclusivamente para pessoas negras. Pelo contrário”, fez coro Pacheco.
“O fato é que ver todos esses temas legitimados como se fossem exclusivos de um grupo específico criou muitas brechas para fragilizar nossa democracia”, acrescentou o pesquisador.
Pacheco deu como exemplo os ataques às pautas de gênero e raça que iniciaram e encerraram o primeiro mandato do atual presidente americano, Donald Trump.
Risco generalizado
Na época, disse o teólogo, o entendimento da opinião pública foi de que essas duas perseguições só colocavam aqueles dois grupos em risco, não a democracia como um todo.
Trump retomou a mesma estratégia ao voltar à Casa Branca neste ano. Mas agora, como os ataques atingem também a elite intelectual branca, alvo de medidas contra universidades como Harvard, a estratégia é vista como um risco mais amplo à democracia americana, afirmou Pacheco. “O que fragiliza grupos minoritários hoje é uma lacuna na democracia que vai prejudicar todo um país amanhã.”
Ao final da conversa, a mediadora Adriana Ferreira Silva perguntou aos dois autores que histórias eles gostariam de ler ou contar no futuro. A resposta, coincidentemente, foi a mesma: aquelas para crianças. “São histórias que formam as pessoas”, resumiu Pacheco.
A quarta edição d’A Feira do Livro 2025 acontece de 14 a 22 de junho, na praça Charles Miller, no Pacaembu. Realizado pela Associação Quatro Cinco Um, pela Maré Produções e pelo Ministério da Cultura, o festival literário paulistano, a céu aberto e gratuito, reúne mais de duzentos autores e autoras do Brasil e do exterior em uma programação com mais de 250 atividades, entre debates, oficinas, contações de histórias e encontros literários. Confira a programação e outras notícias do festival.
A Feira do Livro 2025 · 14 — 22 jun. Praça Charles Miller, Pacaembu
A Feira do Livro é uma realização do Ministério da Cultura, por meio da Lei Rouanet – Incentivo a Projetos Culturais, Associação Quatro Cinco Um, organização sem fins lucrativos dedicada à difusão do livro e da leitura no Brasil, Maré Produções, empresa especializada em exposições e feiras culturais, e em parceria com a Prefeitura de São Paulo.
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JUNHO, 2025