
Bagagem Literária,
Independentes, uni-vos
Editoras de pequeno e médio porte de várias regiões do país participam pela primeira vez da Bienal do Livro do Rio no estande Compiladas
30abr2025Eficiente na missão de aproximar multidões das obras literárias e de seus autores há mais de quatro décadas, a Bienal do Livro do Rio de Janeiro tem o desafio de surpreender a cada edição. E mais ainda no ano em que a cidade foi alçada a Capital Mundial do Livro, chancela da Unesco para fomentar a leitura em diferentes metrópoles do mundo que o Rio ostenta desde 23 de abril até o mesmo mês do ano que vem. Na Bienal de 2025, que acontece de 13 a 22 de junho, haverá espaço no Riocentro, na Barra da Tijuca, para novidades grandiloquentes como a roda gigante Leitura nas Alturas e um labirinto fantástico, mas também para uma bem-vinda diversificação: pela primeira vez, um grupo de vinte editoras independentes, de várias regiões do país, vai participar da festa.
Juntas, as casas editoriais Arquipélago (RS), Âyiné (MG), Bazar do Tempo (RJ), Carambaia (SP), Cobogó (RJ), Dublinense (RS), Ercolano (SP), Fósforo (SP), Ímã Editorial (RJ), Lote 42 (SP), Mundaréu (SP), Mórula (RJ), Nós (SP), Oficina Raquel (RJ), Relicário (MG), Seiva (SP), Solisluna (BA), Tabla (RJ), Tinta-da-China Brasil (SP) — selo editorial da Associação Quatro Cinco Um — e Ubu (SP) vão ocupar, ao longo dos nove dias do evento, o estande Compiladas, espaço de duzentos metros quadrados, localizado no Pavilhão 4 e composto por áreas de exposição individualizadas, além de mesões coletivos.
Todas foram fundadas no século 21, com exceção da soteropolitana Solisluna, no mercado desde 1993. “Sendo fora do eixo [Rio-São Paulo], a gente precisa se reinventar num mercado tão concentrado. São muitos brasis, né?”, diz Kin Guerra, da editora baiana. “Essa iniciativa dialoga com tudo que a gente faz, no coletivo conseguimos fazer mais e melhor.”
As vinte empresas têm outros pontos em comum, como títulos que prezam pela excelência gráfica e relevância editorial, além da aposta em novos nomes, com vários de seus autores integrando a programação de debates e atividades da Bienal. “Faz muito sentido que todas estejam lá. Para nós é uma oportunidade importante, ainda mais no ano da Capital Mundial do Livro, mas para a Bienal também é muito interessante contar com editoras que vêm acrescentando tanto ao catálogo [de publicações] do país. É um ganha-ganha”, afirma Rita Mattar, da paulistana Fósforo.
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O ineditismo não é à toa. Estar num evento como este é caro para editoras pequenas e médias. “Uma iniciativa deste porte só compensaria com um estande muito grande, o que seria viável apenas se a Bienal concordasse com a ideia”, observa Ana Cecilia Impellizieri, da carioca Bazar do Tempo. “Os organizadores foram bastante receptivos desde o começo, participando inclusive da decisão sobre o número ideal de editoras.”
Cooperação
Em edições passadas da Bienal, algumas, como a própria Bazar do Tempo, já colocaram seus livros num outro formato de estande coletivo, o Boulevard Literário — uma parceria entre a Catavento Distribuidora e as livrarias cariocas Janela e Leonardo da Vinci, com apoio do Sindicato Nacional de Editores de Livros (SNEL) e da GL Eventos, que organizam a Bienal. “Ali a proposta era diferente, sem a ênfase na marca da editora”, conta Impellizieri. “Mas foi importante e nos deu segurança para esse novo passo.” Tratando-se de uma feira literária, as vendas evidentemente importam, mas os editores enxergam outras oportunidades.
Chegar a um público novo é um deles. A Solisluna, por exemplo, tem um robusto catálogo de obras infantis e espera alcançar mais pais e professores. Mesmo que não conclua uma compra ali, o leitor em potencial poderá conhecer as obras, a proposta editorial e os profissionais das pequenas empresas. “Nossos autores vão passar pelo estande, e queremos ressaltar a presença dos editores. Não vai ser um atendimento frio de um vendedor contratado na hora”, opina Gustavo Faraon, da porto-alegrense Dublinense. “Queremos estar juntos, mas precisamos que nossas individualidades sejam reconhecidas pelos leitores. Nossa chance de chamar atenção num universo como a Bienal é pela relevância.”
Além do potencial de vendas, a Bienal do Livro permite que as editoras alcancem novos leitores
Outro ganho, é claro, é a união de esforços para possibilitar algo que dificilmente seria viável de forma individual. Até porque no mesmo período, de 14 a 22 de junho, estará acontecendo em São Paulo A Feira do Livro, realizada pela Associação Quatro Cinco Um e a Maré Produções, que já estava confirmada quando o evento carioca, normalmente realizado em setembro, foi antecipado por conta das celebrações do Rio Capital Mundial do Livro. “A maioria de nós vai estar na feira paulistana também, só essa coletividade permite que participemos das duas ao mesmo tempo”, observa Maíra Nassif, da belo-horizontina Relicário.
Num projeto coletivo, as complexidades aumentam, mas as soluções criativas também. “Cada editora soma com o que faz de melhor. Formamos grupos de trabalho, e está tudo fluindo muito bem”, detalha ela. Enquanto certas editoras cuidam da produção de uma identidade visual forte, outras colaboram na relação institucional com a Bienal, por exemplo. “Temos experiências diferentes, mas nesse contexto coletivo somos todas aprendizes, e isso está sendo bem legal”, acrescenta Impellizieri, da Bazar, chamando atenção também para a oportunidade de conhecer melhor os catálogos das parceiras.
Não que a opção pela coletividade seja novidade no meio das editoras independentes. Na Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), por exemplo, algumas do grupo vêm se juntando para criar espaços da programação paralela, como a Casa Sete Selos (formada por Âyiné, Bazar do Tempo, Carambaia, Círculo de Poemas, Cobogó, Fósforo e Ubu, além da revista Gama, da livraria Megafauna e da editora de audiolivros Supersônica) e a Paratodos (composta por Dublinense, Nós, Relicário, Roça Nova e Tabla).
“As editoras pequenas sempre cooperaram de uma maneira ou de outra. Mas acho que o que mudou nos últimos tempos é que outras pessoas começaram a chegar mais perto”, diz Faraon, da Dublinense. “É um mercado difícil, e todos foram aprendendo a olhar para o lado sem ver só um competidor. Só assim para dar certo, do contrário não daria para juntar vinte egos, vinte maneiras de pensar.”
A experiência está indo bem e pode abrir portas para novas parcerias do tipo, em outros eventos de grande porte. Mesmo animados, os editores envolvidos preferem dar um passo de cada vez. “Não sabemos se vamos vender bem, empatar os custos ou ter prejuízo, mas muita gente vai descobrir essas vinte editoras”, afirma Impellizieri, da Bazar. “Oxalá dê muito certo, é uma semente que está germinando e pode fazer mais gente entender o que é ser uma editora independente no Brasil”, conclui Kin Guerra, da Solisluna.
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