Narradores do Brasil, Repertório 451 MHz,
Lota e Elizabeth
Episódio especial narra a história da poeta Elizabeth Bishop, da arquiteta Lota de Macedo Soares e a relação de amor que quebrou tabus
10dez2021 | Edição #52Ouça mais Episódios
Está no ar o novo episódio narrativo do 451 MHz, o podcast da revista dos livros! Lota e Elizabeth é o sexto episódio em formato narrativo publicado pelo podcast 451 MHz. Os programas perfilam grandes autores e autoras da literatura brasileira, procurando mostrar como a ficção espelha questões centrais da vida do país. Rubem Fonseca, Lygia Fagundes Telles, Nelson Rodrigues, Paulo Freire e Caio Fernando Abreu foram os outros autores a receber a homenagem.
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Lota de Macedo Soares e Elizabeth Bishop viveram uma relação de amor, vida e realização artística que quebrou tabus no Brasil dos anos 50 e 60. Juntas, elas mudaram a forma como olhamos para o país, para nossas cidades e também para o amor entre mulheres. Este episódio especial narrativo conta a história de Elizabeth, Lota e sua grande criação, o parque do Flamengo. O programa tem participação especial do tradutor de Bishop, Paulo Henriques Britto, das historiadoras Nadia Nogueira e Silvia Ilg Byington e do editor Sebastião Lacerda. Apresentação de Flora Thomson-DeVeaux (de Praia dos Ossos) e leituras de Bruna Beber.
Caju
Quem esperaria que um caju, uma fruta tão pequena, fosse responsável por transformar uma estadia de alguns dias em vinte anos? Destino ou acaso, foi a crise alérgica que Elizabeth Bishop teve ao experimentar o fruto que mudou o rumo de sua vida. Acostumada com a solidão, a poeta norte-americana ficou aos cuidados de Lota de Macedo Soares e se encantou. Na época, Lota mantinha um relacionamento com Mary Morse, mas isso não impediu que Lota e Bishop se apaixonassem, e a brasileira pediu à norte-americana que ficasse no Brasil.
Elizabeth Bishop [Fundo Correio da Manhã]
Cartão postal
Lota de Macedo Soares nasceu em uma família aristocrática, era culta, falava francês fluente e um pouco de inglês. Após a separação dos pais, foi morar em Nova York e retornou ao Brasil acompanhada de Mary Morse. Nessa época, Lota projetou sua casa no bairro de Samambaia, na cidade de Petrópolis.
Lota de Macedo Soares [Instituto Lotta/Reprodução]
Quando Lota conheceu Elizabeth, o projeto de Petrópolis ainda não havia sido finalizado, e Lota decidiu criar um espaço para Bishop. O estúdio, construído em um canto recluso do terreno, foi onde a poeta escreveu muitas de suas principais produções. E Lota está escondida em vários cantos da obra poética de Bishop.
A norte-americana, que sempre havia sido bastante solitária e reservada sobre sua sexualidade, parecia ter encontrado um lar, afeto e estabilidade emocional, além do acesso restrito ao álcool — a poeta gostava de beber, e bebia muito. “Foram os anos mais felizes da vida da Bishop. A Lota sabia exatamente o que ela queria e proporcionou a ela tudo que ela realmente precisava”, conta o tradutor Paulo Henriques Britto.
Em 1960, Lota foi convidada por Carlos Lacerda, seu amigo pessoal e recém-empossado governador do Estado de Guanabara, a realizar o projeto do parque do Flamengo. Foi a primeira vez que a arquiteta autodidata adotou um trabalho tradicional, ao qual se dedicou integralmente. Durante cinco anos, o projeto do parque se tornou a paixão de Lota, abalando seu relacionamento com Bishop.
“Tudo levava a crer que as duas iam ficar velhinhas juntas. O grande transtorno que acabou com a paz da Bishop, a paz do casal, foi o Aterro do Flamengo. Foi a grande realização da Lota, e, ao mesmo tempo foi, pra relação das duas, uma catástrofe”, diz Paulo Henriques Britto. Nos anos 60, a relação delas começou a “ir pro espaço”.
Anos 60
Elizabeth Bishop foi indicada como homenageada da Flip 2020, posto do qual foi deposta em meio a polêmica e pandemia. Teve muita gente incomodada com o fato de ela não ser uma escritora brasileira, mas também muita oposição à nomeação da Bishop por ela ser, supostamente, apoiadora da ditadura militar. Se considerarmos a obra de Bishop como sendo apenas sua poesia, não há qualquer menção ao golpe ou à ditadura. Mas Bishop era uma grande “epistológrafa”, autora de cartas.
Suas cartas, escritos íntimos, foram publicadas postumamente, e são analisadas dentro da sua obra, como a de tantos outros autores. Nessas cartas ela deixou registrada sua reação ao golpe de 64 — uma reação menos de entusiasmo do que de alívio. É importante lembrar do contexto: Bishop absorvia o noticiário basicamente por Lota e seus amigos, que tinham medo de um levante comunista que supostamente vinha sendo gestado. Além disso, depois de anos de brigas sobre o Aterro, Bishop estava cansada de política brasileira em geral.
Em julho de 1967, Bishop parte para uma temporada em Nova York. Lota foi atrás poucos meses depois. “Pelas cartas da Bishop, elas não conseguem conversar. E na primeira noite a Lota já toma um vidro de Valium”, conta Nadia Nogueira. Lota morreu poucos dias depois. Bishop morreu em 79. Dois anos antes, ela havia mandado um projeto de livro para um edital: seria uma longa elegia, à Lota.
Vozes
O episódio tem a participação da historiadora Nadia Nogueira, que escreveu uma tese de doutorado sobre o relacionamento de Lota e Elizabeth; a historiadora Silvia Ilg Byington, que estuda as relações entre memória e arquitetura; o tradutor e poeta Paulo Henriques Britto; e o editor Sebastião Lacerda. As leituras do episódio foram feitas pela poeta Bruna Beber e o roteiro e a apresentação são de Flora Thomson-DeVeaux.
Nadia Nogueira [Acervo pessoal]
A pesquisa de doutorado de Nadia sobre a relação entre Lota de Macedo Soares e Elizabeth Bishop resultou no livro Invenções de si em histórias de amor (Apicuri), lançado em 2008.
Silvia Ilg Byington [Acervo pessoal]
Silvia Ilg Byington é doutora em História Social da Cultura e trabalha como pesquisadora do núcleo de memória da PUC-Rio. Silvia comenta o legado de Lota de Macedo Soares no patrimônio cultural do Rio de Janeiro.
Paulo Henriques Britto [Acervo pessoal]
Paulo Henriques Britto é tradutor, poeta, professor carioca e um dos maiores especialistas brasileiros na obra de Elizabeth Bishop. Ganhador do prêmio Oceanos e tradutor de escritores de língua inglesa como Philip Roth, William Faulkner e Charles Dickens, traduziu boa parte das obras de Elizabeth Bishop para o português. Ele também participou do episódio do 451 MHz sobre Elizabeth Bishop.
Sebastião Lacerda [Colégio Andrews]
O editor Sebastião Lacerda, filho do político Carlos Lacerda, relembra o contato que teve quando criança com Lota de Macedo Soares, Elizabeth Bishop e Mary Morse. A ousadia e a irreverência no palavreado de Lota são parte de suas memórias.
Bruna Beber [Renato Parada]
As leituras de poemas e trechos de cartas da Elizabeth Bishop foram feitas pela poeta Bruna Beber, que já escreveu na revista dos livros sobre a escritora Gertrude Stein e participou do episódio do 451 MHz dedicado a Stella do Patrocínio.
Flora Thomson-DeVeaux
Flora Thomson-DeVeaux, tradutora norte-americana radicada no Brasil, é colaboradora frequente da Quatro Cinco Um — já participou do 451 MHz como entrevistada, sobre a tradução de Memórias póstumas de Brás Cubas — e diretora de pesquisa da Rádio Novelo.
O episódio tem apresentação de Paulo Werneck, editor da Quatro Cinco Um.
#DesafioLotaeBishop
No final do episódio, lançamos o #DesafioLotaeBishop. O ouvinte que der a melhor resposta vai ganhar uma seleção de livros de Elizabeth Bishop, com Poemas escolhidos, Prosa, Questões de viagem e Uma arte, publicados pela editora Companhia das Letras. Para concorrer, publique a sua resposta nas redes sociais — Facebook, Twitter e Instagram — com a hashtag #DesafioLotaeBishop e marque o perfil da revista (@quatrocincoum). O vencedor será anunciado nas redes da Quatro Cinco Um em janeiro de 2022. As respostas poderão ser divulgadas no site, na newsletter e nas redes da revista. Ouça o episódio para saber mais.
Mais na Quatro Cinco Um
Bishop foi indicada como homenageada da Flip 2020, posto do qual foi deposta em meio a polêmica e pandemia. Na altura de sua indicação, em 2019, Paulo Werneck, diretor de redação da Quatro Cinco Um e ex-curador da Flip, escreveu sobre a poeta americana e sua viagem a Paraty sessenta anos antes, e o colunista da revista Paulo Roberto Pires comentou a polêmica. No ano anterior, a escritora Gabrielle Bellot comparou sua experiência com a solidão com a da poeta, que evitou a vida toda expor sua sexualidade.
O episódio especial Lota e Elizabeth foi feito com o apoio do C6 Bank.
O 451 MHz tem apoio dos Ouvintes Entusiastas. Seja um você também!
O 451 MHz é uma produção da Rádio Novelo e da Associação 451.
Direção geral: Paulo Werneck
Apresentação: Paulo Werneck e Flora Thomson-DeVeaux
Participação especial: Bruna Beber
Coordenação geral: Vitor Hugo Brandalise
Roteiro: Flora Thomson-DeVeaux
Tratamento de roteiro: Paula Scarpin
Produção: Ashiley Calvo
Direção de locução: Paula Scarpin e Gabriela Varella
Edição: Cláudia Holanda
Sonorização: Paula Scarpin
Captação de áudio externo: Flora Thomson-DeVeaux e Paula Scarpin
Música tema: Guilherme Granado e Mario Cappi
Trilha adicional: Daniel Limaverde
Finalização e mixagem: João Jabace
Ilustração: Rafa Campos Rocha
Identidade visual: Quatro Cinco Um
Coordenação digital: Juliana Jaeger
Distribuição: Bia Ribeiro
Gravado com apoio técnico dos estúdios Tyranosom e Confraria de Sons & Charutos, em São Paulo, e do Estúdio Rastro, no Rio de Janeiro.
Neste episódio, você ouviu as músicas “Morro de Santo Antônio”, de Benedito Lacerda e Herivelto Martins, nas vozes do Trio de Ouro; “Daqui Não Saio”, de Paquito e Romeu Gentil, cantada pelos Vocalistas Tropicais; “A Favela Vai Abaixo”, do Sinhô, na voz do Francisco Alves; “Praça Onze”, de Herivelto Martins e Grande Otelo, na interpretação do Trio de Ouro; “Opinião”, de Zé Keti, cantada por ele próprio; e áudio de arquivo da inauguração do Aterro do Flamengo do Arquivo Nacional.
Foram lidos, na ordem, os poemas “Manuelzinho” e “Song for the Rainy Season”, ou “Canção da estação das chuvas”. E cartas da Bishop da coletânea Uma arte, com tradução de Paulo Henriques Britto.
Para falar com a equipe: contato@ arevistadoslivros.com.br
Matéria publicada na edição impressa #52 em outubro de 2021.
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