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A cobertura especial d’A Feira do Livro, que acontece de 14 a 22 de junho, é apresentada pelo Ministério da Cultura e pela Petrobras

MINISTÉRIO DA CULTURA E PETROBRAS APRESENTAM

Ana Silva Rosa, Luciana Silva Reis, Mariana Celano Amaral e André Ítalo Rocha (Nilton Fukuda)

A FEIRA DO LIVRO 2025,

Pesquisadoras veem ativismo coordenado na raiz do novo conservadorismo

Coautoras de A lei da bala, do boi e da Bíblia, Mariana Celano Amaral, Luciana Silva Reis e Ana Silva Rosa apontam que discurso homogêneo se sobrepõe a divergências na direita extremista

20jun2025

As pesquisadoras do Laut (Centro de Análise da Liberdade e do Autoritarismo) Mariana Celano de Souza Amaral, Luciana Silva Reis e Ana Silva Rosa discutiram nesta quinta (19), n’A Feira do Livro, como três dos principais eixos representativos do novo conservadorismo brasileiro, os grupos “da bala, do boi e da Bíblia”, construíram nos últimos anos uma aliança que tem em sua base uma crescente homogeneidade no discurso. 

Coautoras, com Adriane Sanctis de Brito, da coletânea A lei da bala, do boi e da Bíblia: cultura democrática em crise na disputa por direitos  — publicado em 2024 pela Tinta-da-China Brasil, selo editorial da Associação Quatro Cinco Um —, Amaral, Reis e Rosa apontaram que esse ativismo coordenado vem se sobrepondo a divergências internas no campo da direita extremista, que defende pautas restritivas de direitos. O diagnóstico marcou a mesa A lei da bala, do boi e da Bíblia, que teve mediação do jornalista André Ítalo Rocha. 

Luciana Silva Reis deu início à conversa ressaltando que o “autoritarismo não é só um fenômeno eleitoral” recente no Brasil, pois tem raízes históricas bem conhecidas. Segundo ela, a fagulha para escreverem A lei da bala, do boi e da Bíblia foi perceber que as pautas conservadoras defendidas pelos grupos da direita vinham se tornando autoritárias, por se caracterizarem nos últimos anos como antipluralistas e antidemocráticas. 

“Procuramos entender quais eram os feixes de força da coalizão reacionária. Foi assim que chegamos ao BBB [bala, boi e Bíblia]”, explicou Ana Silva Rosa, em referência aos grupos que defendem o armamentismo na segurança pública, a sobreposição das questões fundiárias que interessam ao agronegócio à pauta ambiental, e a expansão da moralidade evangélica para todos os setores da vida social.

Além das bancadas 

Embora falar em “bala, boi e Bíblia” remeta quase instintivamente às bancadas parlamentares desses grupos no Congresso Nacional, as pesquisadoras sublinharam que a atuação desses três eixos da direita extremista não se limita às atividades legislativas de deputados federais e senadores.

“Existe um associativismo de direita, que se coloca no âmbito dos Três Poderes da República”, disse Luciana Silva Reis, explicando que durante a pesquisa para o livro — que envolveu a análise de mais de quatrocentos documentos públicos do Legislativo, Executivo e Judiciário — as autoras identificaram que organizações representativas da direita têm se posicionado cada vez mais na discussão de matéria de interesse, dos debates legislativos a julgamentos no Supremo Tribunal Federal.

As pesquisadoras e autoras da coletânea A lei da bala, do boi e da Bíblia: cultura democrática em crise na disputa por direitos, publicado em 2024 pela Tinta-da-China Brasil (Nilton Fukuda)

Como exemplo, ela citou a Associação Nacional de Juristas Evangélicos, a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e a Sociedade Brasileira do Agronegócio. Os diferentes grupos conservadores, apontou Ana SIlva Rosa, estão falando a mesma linguagem. “Mesmo em grupos mais heterogêneos, como os evangélicos, existe uma grande homogeneidade nas argumentações” — o que evidencia a sintonia no discurso.

“As três coalizões se colocam como verdadeiras representantes dos anseios do povo brasileiro”, complementou Reis. Além disso, a “bala” e a “Bíblia” aprenderam com o “boi” a se profissionalizar e institucionalizar, por exemplo, por meio de associações.

Quarto ‘b’

Uma pergunta da plateia indagou como a “bala, o boi e a Bíblia” se relacionavam com um quarto “b”, o de Bolsonaro. “É claro que a presidência de [Jair] Bolsonaro empoderou esses grupos”, disse Luciana Silva Reis. Mais do que isso, “trouxe oportunidades e proporcionou vitórias”, continuou a pesquisadora, citando como exemplos decretos pró-armas e pró-agro aprovados durante o governo do ex-presidente.

Essas conquistas, acreditam as pesquisadoras, se refletiram em uma mudança de atitude observada nos últimos tempos. “Vemos por parte desses grupos reacionários cada vez mais pautas propositivas, em vez de reativas”, disse Mariana Celano Amaral, lembrando de tentativas recentes de membros da bancada evangélica de restringir o direito ao aborto. 

A quarta edição d’A Feira do Livro 2025 acontece de 14 a 22 de junho, na praça Charles Miller, no Pacaembu. Realizado pela Associação Quatro Cinco Um, pela Maré Produções e pelo Ministério da Cultura, o festival literário paulistano, a céu aberto e gratuito, reúne mais de duzentos autores e autoras do Brasil e do exterior em uma programação com mais de 250 atividades, entre debates, oficinas, contações de histórias e encontros literários. Confira a programação e outras notícias do festival.

A Feira do Livro 2025 · 14 — 22 jun. Praça Charles Miller, Pacaembu

A Feira do Livro é uma realização do Ministério da Cultura, por meio da Lei Rouanet – Incentivo a Projetos Culturais, Associação Quatro Cinco Um, organização sem fins lucrativos dedicada à difusão do livro e da leitura no Brasil, Maré Produções, empresa especializada em exposições e feiras culturais, e em parceria com a Prefeitura de São Paulo.

Quem escreveu esse texto

Vitor Pamplona

Jornalista e roteirista, traduziu As aventuras de uma garota negra em busca de Deus (Bissau Livros)