ULTRARROMANTISMO NA VEIA Em Gemidos poéticos: sobre os túmulos, de 1844, uma pequena vinheta aparece centralizada. Soma-se a ela a tipografia de personalidade, mas em escala reduzida. Fios enquadram as informações, delimitando um campo interno à capa. O jeito singelo como tudo se organiza acaba por jogar luz sobre o desenho, no qual, de modo contundente, vemos retratada uma urna funerária à sombra de um cipreste.
E NADA MUDOU A atualidade da linguagem gráfica desta capa centenária, desenhada por J. Wasth Rodrigues (1891-1957) para o Sacy-Pererê, de Monteiro Lobato — figura-chave na história das capas —, é assombrosa. O alto contraste entre figura e fundo é o que, por síntese, dá força à composição. Já a tipografia meio gauche, cujo “a” é extremamente idiossincrático, parece ter sido criada ontem por algum type-designer do momento.
A SAÍDA PELA FORMA Desenhar a capa de um livro de poemas guarda um desafio extra para o designer: como traduzir visualmente o que é dado por abstração? Na poesia, a escrita modulada em versos acaba por evidenciar a estrutura formal do texto — e é isso o que esta capa de 1927 parece sintetizar.
Primórdios do choque Provocando a caretice da sociedade do fim do século 19, as capas dos livros naturalistas — como esta de 1890 — passaram a usar imagens de nus femininos. É evidente que, para além de buscar a tensão, o recurso se transforma em estratégia para potencializar o tal apelo de venda, no jargão do marketing contemporâneo. Não à toa, ainda hoje é um tanto utilizada para vender cervejas e afins.
O ILUMINADO J. Carlos (1884-1950) é peça fundamental na história das capas — e a de Chronicas da cidade maravilhosa, livro escrito na década de 1930 por encomenda da Light, nos diz o porquê. Uma paleta cromática vibrante se espelha nas formas impregnadas pelo vocabulário art déco. Nela, imagem e texto são tratados da mesma maneira — enérgica — para traduzir visualmente o dinamismo da cidade moderna.
CINQUENTA TONS DE ROSA Cenógrafo e pintor, crítico e artista gráfico: Santa Rosa (1909-56) retrata um tempo que antecede a era da hiperespecialização. Na capa de “Café-Society” — confidencial (1956), de José Mauro Gonçalves, por meio da colagem, articula com desenvoltura a linguagem gráfica, ao se apropriar da elegante visualidade das revistas de moda norte-americanas — sem dispensar certa ironia.
NA PENUMBRA Na capa desenhada por Dorca, figuras e letras são feitas de uma mesma matéria — luz. Soturna, ela reconstrói o clima de “O jovem audaz no trapézio volante”, conto que dá título ao livro de William Saroyan. Personagem obscura é também a própria Dorca. Autora de centenas de capas, mas de quem pouco se sabe, merece há muito um livro que documente a sua produção singular.