(Pedro Strelkow/Divulgação)

Fichamento,

Angélica Freitas

A poeta gaúcha, autora de Um útero é do tamanho de um punho, lança plaquete com seus monstros desenhados quase às cegas

01mar2025 • Atualizado em: 25fev2025 | Edição #91 mar

Mostra monstra (Círculo de Poemas) faz parte de um projeto da autora que une desenho e escrita para acessar o subconsciente e investigar a linguagem poética.

Quem é o pai de todos os monstros?
Uau! Nem sei, talvez tenha mais de um pai. E uma mãe. Essa série é um recorte de um projeto maior de escrever a partir de desenhos e tentar acessar o subconsciente. O pai dos monstros pode ser o subconsciente.

Que projeto é esse?
Dei o nome de Poemas Míopes. Tenho quase dez graus de miopia e agora não consigo enxergar de perto também. Com esses óculos multifocais deu uma resolvida, mas pensei no que aconteceria se não conseguisse enxergar o papel. Para esse projeto, eu tirava os óculos para desenhar, recolocava ao terminar e era sempre uma surpresa — achava que estava fazendo uma coisa e era outra. A partir dessa surpresa, tirava os óculos de novo e imediatamente tinha que escrever a partir do que tinha visto, sem ficar analisando. Desenhei quase todos os monstros dessa série no mesmo mês. Fiquei meio obcecada com o projeto, tenho vinte cadernos que enchi de poemas e desenhos.

Um monstro é do tamanho de quê?
Nunca maior do que a sua cabeça ou das coisas que podem sair dela. Às vezes, ele é muito menor do que a gente enxerga. Minha experiência com monstros é bastante intuitiva e muito recente. Quando desenhava, minha mão queria fazer um círculo, por exemplo, e eu falava, “não, vamos puxar uma linha daqui”, e aí apareciam os monstros. Não era “vamos desenhar uma coisa estranha aqui” que eu já sabia o que era. Tem uma frase do [escritor] Tom Robbins que gosto muito: “Eu não sou um animal, sou um zoológico”. Isso de desenhar e escrever pode ser uma maneira de testar esses monstros e o zoológico que estão dentro da gente.

Uma experiência corporal?
Totalmente. Li que quando você desenha não tem uma voz, tem um corpo. É uma maneira de investigar como se escreve poesia. E o que consegui escrever é diferente de outras coisas que já fiz, em que eu colocava minha experiência como fonte do que estava escrevendo.

Mas também tem semelhanças com outros trabalhos, como o humor…
Os monstros que saíram não me assustaram, talvez porque sejam parte de mim. São mais fofinhos, não uma coisa que você olha e diz: “Que medo!”. O humor que eu gosto deixa as coisas mais vivas, se você está meio dormindo, ele te acorda. E gosto mesmo de escrever assim, quando a coisa é meio engraçada fico feliz.

Quais são suas assombrações?
Hoje o que me assombra é a volta do fascismo. As coisas aqui na Alemanha, onde estou morando, estão bem estranhas, para dizer o mínimo. A extrema direita está ganhando muito espaço.

Como é morar em terras estrangeiras?
Aconteceu de eu morar em vários lugares. Uma explicação para isso é ter nascido numa cidade do interior [Pelotas, rs] e muito cedo ter me dado conta que tinha que sair de lá. Sou lésbica, sempre soube, e já na adolescência sabia que precisava ir para outro lugar. Outra explicação é gostar de viajar. Sempre quis vir para Berlim. No início dos anos 2000 tinha amigos artistas que moravam aqui, alugavam quartinhos, tudo muito barato. Queria essa vida de artista, escrever nos cafés, achava tudo lindo. Já morei duas vezes em Berlim. Nessa atual, ganhei uma bolsa em um programa de residência literária em 2020. Quase não consegui viajar por causa da covid, mas assim que deu uma brecha eu e a Juliana [Perdigão], com quem sou casada, viemos para cá com nossas gatas. Mas já estamos voltando para o Brasil.  

Quem escreveu esse texto

Iara Biderman

Jornalista, editora da Quatro Cinco Um, está lançando Tantra e a arte de cortar cebolas (Editora 34)

Matéria publicada na edição impressa #91 mar em março de 2025. Com o título “Angélica Freitas”

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