A escritora e professora Ana Rüsche (Luiza Sigulem)

Fichamento,

Ana Rüsche

Escritora e professora lança romance que celebra a poesia em uma mistura de tempos históricos, ação e introspecção

01jun2025 • Atualizado em: 29maio2025 | Edição #94

Poetas dos anos 80, pesquisadores dos 2000, HIV, coronavírus, pegação, ecologia e até um biofilme alucinógeno convivem em Carga viva (Rocco).

Em Carga viva, você mistura tempos, cruza cenários de epidemias (aids, Covid-19) e cria uma distopia invertida. Como chegou nisso?
Minha principal referência foi um romance publicado em 1995, Risco de vida [Globo], do Alberto Guzik, em que ele conta como foi perder os grandes amores de sua vida para o hiv. Quando a Covid-19 bateu, eu estava segura em casa com meu cachorro, mas fiquei pensando nas pessoas que eu amava e iria perder. Tanto no caso da Covid-19 quanto no da aids, foram mortes políticas, evitáveis. E tem também a questão de isolar as pessoas contaminadas, é tristíssimo. Então, quando bateu a pandemia, pensei muito no livro do Guzik e fui reler.

Além desse paralelo, houve outros motivos para ambientar o núcleo do romance nos anos 80? 
É um pouco a literatura fazendo um acerto de contas. A gente fala de 1985 [eleição indireta de Tancredo Neves] e de 1988 [Assembleia Constituinte], mas o que aconteceu entre 85 e 88? Faltam esses anos.

No livro, você mistura a trama dos anos 80 com acontecimentos dos 2020, mas estes últimos são menos colados na história real, mais esperançosos…
Já trabalhei muito com distopias, mas gosto de utopias também. Quis trazer uma história alternativa, uma das funções da literatura é abrir um horizonte imaginativo. Será que a gente não consegue imaginar um país em que o Bolsonaro não tivesse vencido [a eleição de 2018]? Para mim, a graça do livro é achar uma saída utópica que é construída em conjunto pelas pessoas. 

Carga viva não tem exatamente um protagonista, mas tudo gira em torno de um poeta com hiv. Você se inspirou diretamente em alguém? 
Tentei criar um poeta daquela época, dar voz a uma certa geração que ficou esmagada no seu tempo histórico. Quis prestar uma homenagem. No final das contas, é um livro sobre a poesia. O livro é dedicado ao Guzik e ao Alfredo Fressia, poeta uruguaio que veio para o Brasil fugindo da ditadura em seu país. 

Qual sua relação com a poesia?
Estreei [na literatura] em 2005 e publiquei muita poesia. Participei de festivais no mundo todo, até na China, amo dar aula sobre esse tema. Mas acho que o gênero ainda é muito invisibilizado no mercado. E que o grande público acredita que precisa ter uma iniciação para poder ler obras poéticas. Quis escrever um livro para que as pessoas vissem que não é tão difícil, pensei em um romance que fosse uma espécie de “droga de entrada” ao universo da poesia.

Parte da trama de Carga viva gira em torno de uma substância orgânica com propriedades psicodélicas. É mais um tema que você estuda?
Pesquiso muito ecologia, e tem um ramo forte desses estudos sobre substâncias como a psilocibina [encontrada em cogumelos]. Achei que valia a pena falar de uma substância que introduzisse um elemento insólito na história. As alucinações [causadas pela substância que os personagens encontram, um biofilme] abrem uma porta para o texto ir para outros lugares. É interessante fazer com que a literatura possa pensar em outras formas de viver no planeta. 

A Ana pesquisadora, acadêmica, influenciou a escrita? 
Quis fazer um livro que as pessoas tenham tesão em ler. Para quem lê pouco ir até o final. Uso suspense, faço cena de festa, tem pegação, tiro de arma, ação. Uso elementos muito comuns da literatura popular para fazer a Carga viva chegar ao coração das pessoas.

Quem escreveu esse texto

Iara Biderman

Jornalista, editora da Quatro Cinco Um, é autora de Tantra e a arte de cortar cebolas (Editora 34).

Matéria publicada na edição impressa #94 em junho de 2025. Com o título “Ana Rüsche”

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