
A cobertura especial d’A Feira do Livro, que acontece de 14 a 22 de junho, é apresentada pelo Ministério da Cultura e pela Petrobras
MINISTÉRIO DA CULTURA E PETROBRAS APRESENTAM

A FEIRA DO LIVRO 2025,
Senti que era importante resgatar a história da mulher que inspirou ‘Lady Tempestade’, diz autora da peça
Silvia Gomez conversou com o jornalista Samarone Lima sobre Mércia Albuquerque, advogada que defendeu centenas de dissidentes durante a ditadura
19jun2025Uma figura pouco lembrada, mas central para a resistência à ditadura militar brasileira, liga a dramaturga Silvia Gomez e o jornalista Samarone Lima, convidados da mesa que abriu A Feira do Livro nesta quinta-feira (18): a advogada Mércia Albuquerque, que defendeu centenas de perseguidos do regime.
Ela inspirou a peça escrita por Gomez, Lady Tempestade, atualmente em cartaz no Sesc Consolação, na capital paulista. Protagonizada por Andréa Beltrão e dirigida por Yara de Novaes, ela teve o seu texto integral publicado pela editora Cobogó. O título da peça foi retirado de um trecho do diário da advogada, que serviu de base para o texto dramatúrgico, publicado em 2023 pela editora Potiguariana. Nesse texto, Albuquerque compara sua mãe à “bonança”, em contraste com a “tempestade”, que era como ela se via.

A advogada também é tema de um capítulo de Zé, biografia de José Carlos Novaes da Mata lançada por Lima em 1998, pela editora Mazza. Albuquerque foi a responsável por encontrar o corpo do jovem militante, que foi torturado e assassinado pelo DOI-Codi do Recife, em 1973, e enterrado como indigente.
Durante a conversa, mediada pela editora da Quatro Cinco Um Iara Biderman, Gomez afirmou que, quando travou contato com a história de Albuquerque pela primeira vez, o que sentiu foi vergonha. “À medida que eu lia sobre ela, mais tinha noção da importância de fazê-la viva de novo”, disse.
Além disso, afirmou a dramaturga, recontar essa história parecia também uma maneira de pensar novas possibilidades de futuro. “Imaginar é uma forma de agir”, disse. “Quando imaginamos, estamos criando uma fissura no presente.”
Silenciamento
Albuquerque morreu em 2003, aos 69 anos, tendo defendido pelo menos quinhentos presos políticos e passado por, no mínimo, doze prisões. Lima contou que, até o início dos anos 90 — época em que ele a entrevistou para a sua pesquisa sobre José Carlos —, ela não tinha sido ouvida.
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Trata-se de um sintoma, segundo o jornalista, do silenciamento sofrido pelas vítimas do regime que reverbera até hoje. “Terminou a ditadura e as pessoas não falaram. Houve um silenciamento que foi muito prejudicial”, afirmou. “Na Argentina, por exemplo, os militares foram julgados logo após a ditadura, e isso teve uma repercussão enorme sobre a população.”
Lima revelou que, a convite da família de Albuquerque, está começando a pesquisa para escrever uma biografia dela, descrita por ele como uma mulher “de olhos acesos”.
Ao mesmo tempo, o jornalista trabalha em uma nova edição de Zé, fora de catálogo há anos. Ele contou que, quando publicou o livro, a história do militante ainda tinha muitas lacunas porque diversas das pessoas próximas dele não podiam compartilhar sua versão dos fatos. Além disso, acrescentou que os documentos produzidos pela Comissão da Verdade, que foram publicados quase quinze anos após o lançamento de Zé, confirmaram as circunstâncias do assassinato que tinham sido aventadas por sua pesquisa.
Ao final da conversa, Biderman, a mediadora, chamou a atenção para como o resgate da figura de Albuquerque parecia se enquadrar em um movimento mais amplo de revisão das memórias da ditadura brasileira a partir de perspectivas femininas. Dentro desse contexto, também se encontra Ainda estou aqui (Companhia das Letras, 2015), livro de Marcelo Rubens Paiva que inspirou o filme homônimo, ganhador do Oscar de filme internacional. Na obra, ele narra a história de sua mãe, Eunice Paiva, viúva do ex-deputado federal Rubens Paiva, que dedicou sua vida a buscar justiça pelo assassinato dele pela ditadura. O autor Marcelo Rubens Paiva também participará de uma mesa n’A Feira do Livro nesta sexta (20).
Questionada sobre a importância desse resgate, Gomez respondeu que foram olhares como os de Albuquerque que a fizeram compreender como a ditadura afetou a população brasileira também dentro de casa. “Ela [a advogada] disse: ‘O ano de 1973 está terminando e não pude confortar todas as esposas, consolar todas as mães, mentir para todas as crianças, porque isso não é possível’.”
A quarta edição d’A Feira do Livro 2025 acontece de 14 a 22 de junho, na praça Charles Miller, no Pacaembu. Realizado pela Associação Quatro Cinco Um, pela Maré Produções e pelo Ministério da Cultura, o festival literário paulistano, a céu aberto e gratuito, reúne mais de duzentos autores e autoras do Brasil e do exterior em uma programação com mais de 250 atividades, entre debates, oficinas, contações de histórias e encontros literários. Confira a programação e outras notícias do festival.
A Feira do Livro 2025 · 14 — 22 jun. Praça Charles Miller, Pacaembu
A Feira do Livro é uma realização do Ministério da Cultura, por meio da Lei Rouanet – Incentivo a Projetos Culturais, Associação Quatro Cinco Um, organização sem fins lucrativos dedicada à difusão do livro e da leitura no Brasil, Maré Produções, empresa especializada em exposições e feiras culturais, e em parceria com a Prefeitura de São Paulo.
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JUNHO, 2025