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A cobertura especial d’A Feira do Livro, que acontece de 14 a 22 de junho, é apresentada pelo Ministério da Cultura e pela Petrobras

MINISTÉRIO DA CULTURA E PETROBRAS APRESENTAM

(Matias Maxx)

A FEIRA DO LIVRO 2025,

‘O homem japonês ainda é muito contido nas manifestações de afeto’, diz Oscar Nakasato

Escritor paranaense foi o convidado de uma edição especial do Clube de Leitura Japan House São Paulo + Quatro Cinco Um, que discutiu o primeiro romance do Nobel Yasunari Kawabata

18jun2025

Em 1948, influenciado pelos acontecimentos da Segunda Guerra Mundial, Yasunari Kawabata fez um retorno ao seu primeiro romance, O país das neves, de 1937. Quase oitenta anos depois, um grupo de leitores se reuniu no Palco Petrobras durante A Feira do Livro, na terça (17), em mais um encontro do Clube de Leitura Japan House São Paulo + Quatro Cinco Um para debater esse mesmo romance, publicado no Brasil pela Estação Liberdade em tradução de Neide Hissae Nagae.

Com mediação de Natasha Barzaghi Geenen, diretora cultural da Japan House São Paulo, e Paulo Werneck, diretor de redação da revista Quatro Cinco Um, o encontro mensal teve como convidado desta edição especial o escritor e professor Oscar Nakasato — vencedor do Jabuti por Nihonjin em 2011 (que ganhou este ano uma reedição Fósforo) e leitor assíduo de Kawabata. 

“Este livro é muito japonês, tanto pelos elementos que descreve acerca da cultura, alimentação, moradia e vestimenta, quanto por nos dar um protagonista que é o típico homem japonês: contido nas manifestações de afeto e nas palavras”, comenta Nakasato, chamando atenção ainda para a descrição dos cenários. 

O escritor e professor Oscar Nakasato (Matias Maxx)

“A melhor coisa que Kawabata faz é descrever, principalmente a natureza. Para a literatura japonesa, a natureza não é somente um pano de fundo, diferente do mundo ocidental, que parece vê-la apenas como utilitária. Lá, existe toda uma integração entre homem e natureza”, diz o escritor.

Assim, o vencedor do Prêmio Nobel de Literatura em 1968 materializa o país, ou ao menos a parte coberta de neve nos meses entre dezembro e março, temporada em que o romance se desenvolve. “Enquanto imaginamos as imagens que Kawabata evoca, a sensação é de que o frio nos acompanha. É uma experiência sinestésica”, diz o Nakasato.

Camadas e contradição

A ideia de um território mergulhado em brancura faz juz à tristeza que acompanha os personagens durante todo o livro, quase como uma névoa que envolve suas vidas, segundo o convidado. “Essas imagens que remetem à tristeza e à pobreza de sentimentos, e que dão uma camada a mais aos personagens, é central na literatura de Kawabata, como em Beleza e tristeza”, pontua Paulo Werneck.

Na versão final do romance, publicada alguns anos após a Segunda Guerra, o bon-vivant Shimamura tem um relacionamento com Komako, uma aprendiz de gueixa que entretém turistas em uma estação de esqui. É através desses personagens que Kawabata tece um jogo de espelhos entre a ocidentalização do Japão durante a era Meiji e a sobrevivência das antigas tradições japonesas.

“O livro é um anotador da mudança cultural no país, porque parte de um observador, um personagem que é manso, em contrapartida a uma personagem que é convulsiva. Há muitos espelhos entre os extremos”, diz Paulo Werneck.

Segundo alguns participantes do clube, que estavam presentes assistindo ao vivo, é nas personagens femininas que Kawabata concentra a contradição, motor da obra, como em Komako, a quem Shimamura visita anualmente, deixando sua família em Tóquio. “A personalidade de Komaco destoa durante o livro. Ora ela é uma gueixa exemplar, ora se mostra como uma bêbada de atitudes incertas”, diz Natasha Barzaghi Geenen. “É Komako que se mostra intensa e complexa, justamente por estar apaixonada dentro da relação entre uma gueixa e um cliente”, complementa Nakasato. 

De acordo com o escritor, a narrativa permite que brasileiros conheçam uma parte do Japão quase esquecida, que também pode ser celebrada graças a um novo grupo de tradutores do japonês, como Rita Kohl e Neide Hissae Nagae, que assina essa tradução.

Público variado

Na noite de terça, na praça Charles Miller, Nakasato comentou ainda que imaginava que veria uma maioria de pessoas nikkei ou nipo-brasileiras na plateia, e se surpreendeu. “É sempre bom ver pessoas parecidas comigo, mas é interessante saber que não apenas os descendentes têm interesse por esta tradição literária”, diz Nakasato, que declarou ter começado a ler as obras de autores japoneses após a publicação de Nihonjin.

“Muitos que leram meus livros me comparam com autores japoneses. Não me comparo, acho que tenho o meu jeito próprio de ser e escrever. Sou muito brasileiro e tenho muito orgulho da minha ascendência japonesa. Adoro dizer que sou nipo-brasileiro”. 

A quarta edição d’A Feira do Livro 2025 acontece de 14 a 22 de junho, na praça Charles Miller, no Pacaembu. Realizado pela Associação Quatro Cinco Um, pela Maré Produções e pelo Ministério da Cultura, o festival literário paulistano, a céu aberto e gratuito, reúne mais de duzentos autores e autoras do Brasil e do exterior em uma programação com mais de 250 atividades, entre debates, oficinas, contações de histórias e encontros literários. Confira a programação e outras notícias do festival.

A Feira do Livro 2025 · 14 — 22 jun. Praça Charles Miller, Pacaembu

A Feira do Livro é uma realização do Ministério da Cultura, por meio da Lei Rouanet – Incentivo a Projetos Culturais, Associação Quatro Cinco Um, organização sem fins lucrativos dedicada à difusão do livro e da leitura no Brasil, Maré Produções, empresa especializada em exposições e feiras culturais, e em parceria com a Prefeitura de São Paulo.

Quem escreveu esse texto

Jaqueline Silva

É estudante de Jornalismo na ECA-USP e assistente editorial na Quatro Cinco Um.