
A cobertura especial d’A Feira do Livro, que acontece de 14 a 22 de junho, é apresentada pelo Ministério da Cultura e pela Petrobras
MINISTÉRIO DA CULTURA E PETROBRAS APRESENTAM

A FEIRA DO LIVRO 2025,
‘O exílio para mim tem dois rostos. Um escolhi, outro não’, diz poeta Ghayath Almadhoun
O escritor sírio-palestino conversou com o poeta maranhense Josoaldo Lima Rêgo sobre exílio, violência e identidade n’A Feira do Livro
21jun2025O sírio-palestino Ghayath Almadhoun e o maranhense Josoaldo Lima Rêgo se encontraram em São Paulo, n’A Feira do Livro, nesta sexta-feira (20). Em comum, além da poesia, os escritores têm o deslocamento.
Almadhoun, filho de mãe síria e pai palestino, nasceu num campo de refugiados em Damasco, capital da Síria. Os avós de Lima Rêgo são do Ceará, os pais do Piauí, e ele nasceu no Maranhão, “um estado de transição, metade Amazônia, metade Nordeste”, como brincou.

No Auditório Armando Nogueira, os dois poetas conversaram com a jornalista e historiadora Paula Carvalho sobre uma poesia em trânsito, que está no exílio e é marcada por violências.
Para Almadhoun, a violência é um dado da história da humanidade. “Um pedaço da violência é a guerra. A guerra faz parte da gente e a arte reflete nossa experiência.”
Pela primeira vez, o poeta sírio-palestino é publicado no Brasil, na coletânea Você deu em pagamento meu país (Ars et Vita), com 31 poemas traduzidos direto do árabe por Alexandre Chareti. Na mesa, Almadhoun, que se exilou na Suécia e hoje vive em Berlim, conversou em inglês, com tradução simultânea de George Karam, e leu vários trechos de seus poemas, em árabe.
Josoaldo publicou, entre outros, A menor das tempestades (Editora 34), em que retrata, de forma concisa, “o conteúdo violento da paisagem brasileira, do Maranhão, do Nordeste” e de personagens e povos historicamente silenciados.
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“Uma coisa central na violência do Brasil é o racismo. Marca nosso modo de vida, nossa arquitetura, nosso imaginário, a forma de olhar para os outros e para a vida. A gente respira violência no Brasil”, disse Josoaldo, que além de poeta é geógrafo.
Seus poemas são fragmentos com imagens de alto impacto — como a fotografia de Claudia Andujar de uma oca pegando fogo, que está na capa e em um poema de seu livro, lido por Josoaldo durante a mesa: “desaparecer é/ o começo o ritual/ a técnica”.
Exílio e identidade
Os poetas também discorreram sobre as questões de fundo que atravessam seus poemas e suas vidas. A poesia de Almadhoun — que, como observou Carvalho, parece prosa — transita da Suécia à Palestina, relatando a guerra, o horror nos territórios ocupados e colocando, muitas vezes com ironia, o dedo na ferida da Europa colonial.
Em um dos poemas que leu para o público no auditório, ele escreve: “pedimos desculpas a todos os olhos que não se atreveram a olhar diretamente para as nossas feridas para não ficarem arrepiados, e pedimos desculpas a todos que não conseguiram terminar o jantar depois de terem sido surpreendidos pelas nossas imagens frescas na televisão”.
“O exílio para mim tem dois rostos. Um escolhi, outro não”, disse Almadhoun. Nascido em um campo de refugiados, esse foi o exílio que herdou do pai. O segundo, escolha própria, foi ter saído da Síria, em 2008, por temer a ditadura de Bashar al-Assad.
Essa condição de exilado influencia sua produção poética. “Quando você é estrangeiro, é difícil criticar. Quem não pode fazer crítica: os negros para os brancos, os indígenas para os colonizadores. Então você cria arte para poder falar.”
Os poetas ainda falaram da questão da identidade, vista pelos dois de forma mais complexa e nuançada do que as polarizações simplistas de muitas polêmicas atuais.
“Identidade é importante para alguns, mas pode ser problemático, se transformar em um nacionalismo. A partir desse momento, é preciso limitar [a afirmação] dessa identidade”, disse Almadhoun.
A quarta edição d’A Feira do Livro 2025 acontece de 14 a 22 de junho, na praça Charles Miller, no Pacaembu. Realizado pela Associação Quatro Cinco Um, pela Maré Produções e pelo Ministério da Cultura, o festival literário paulistano, a céu aberto e gratuito, reúne mais de duzentos autores e autoras do Brasil e do exterior em uma programação com mais de 250 atividades, entre debates, oficinas, contações de histórias e encontros literários. Confira a programação e outras notícias do festival.
A Feira do Livro 2025 · 14 — 22 jun. Praça Charles Miller, Pacaembu
A Feira do Livro é uma realização do Ministério da Cultura, por meio da Lei Rouanet – Incentivo a Projetos Culturais, Associação Quatro Cinco Um, organização sem fins lucrativos dedicada à difusão do livro e da leitura no Brasil, Maré Produções, empresa especializada em exposições e feiras culturais, e em parceria com a Prefeitura de São Paulo.