
A cobertura especial d’A Feira do Livro, que acontece de 14 a 22 de junho, é apresentada pelo Ministério da Cultura e pela Petrobras
MINISTÉRIO DA CULTURA E PETROBRAS APRESENTAM

A FEIRA DO LIVRO 2025,
‘Miliciano circula nos mesmos lugares e você só não sabe quem é’, diz Cecília Olliveira
A autora de Como nasce um miliciano e o jornalista Bruno Paes Manso falaram sobre evolução do crime organizado no país em tablado disputado
21jun2025Uma conversa esclarecedora sobre a evolução do crime organizado no Brasil reuniu um público que extrapolou o espaço do Tablado Literário Mário de Andrade na tarde deste sábado (21) n’A Feira do Livro. A jornalista Cecília Olliveira, uma das fundadoras do site The Intercept Brasil, e o jornalista e pesquisador Bruno Paes Manso falaram sobre as muitas teias que uniram crime, política e religião nas últimas décadas.
Questionada pela mediadora, a jornalista Thais Bilenky, Olliveira falou sobre o que faz alguns policiais se tornarem milicianos. “Ao contrário do que se pensa, não vale a pena em termos de dinheiro, mas em honra, respeito, distinção”, contou a autora do recém-lançado Como nasce um miliciano (Bazar do Tempo).

Autor de livros como A fé e o fuzil: crime e religião no Brasil do século XXI (Todavia, 2023), Paes Manso falou sobre como o crime organizado vem atuando em diferentes áreas. “Há vinte anos, a ideia de crime aqui no Brasil era um menino com um fuzil. Hoje o crime organizado se internacionalizou e o dinheiro que circula entre facções e milícias alimenta outras frentes, como o crime ambiental, a lavagem de dinheiro com carros de luxo, o setor imobiliário”, disse.
Pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo, o jornalista explicou como as igrejas, antes porta de saída do crime, acabaram passando a conviver com as organizações em muitas comunidades, principalmente aquelas onde o Estado está ausente.
Jornalismo
Ao responder perguntas da plateia, os dois jornalistas falaram sobre os desafios e riscos de entrevistar matadores e outros integrantes de facções criminosas. “Meu sucesso é o cara estar desarmado, falando o que ele sente, por que matou, sendo honesto. O que movimenta os sentimentos dele e a racionalidade. Isso que me alimenta”, disse Paes Manso, também autor de A república das milícias (Todavia, 2020).
“Eu preferia cobrir tráfico do que entrevistar milicianos”, disse Olliveira, fazendo o público rir. Segundo a jornalista, milicianos têm mais dinheiro, poder, conexões políticas e são mais poderosos do que quem comanda o tráfico. “O miliciano está no restaurante que você está, circulando nos mesmos lugares, você só não sabe quem eles são.”
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Ela também criticou a cobertura geralmente feita pela mídia sobre os diferentes tipos de criminosos. O traficante é o sujeito levado de qualquer jeito à delegacia, descalço, sem camisa; o miliciano recebe um pouco mais de respeito e o bicheiro segue escoltado por policiais.
“Há gradações que determinam quem é bandido e quem não é. Bicheiros são riquíssimos, dão festa no Copacabana Palace com artistas, estão em páginas de fofocas, namoram artistas globais, têm empreendimentos residenciais. Esses são os criminosos invejados pelos demais.”
PEC da Segurança
Questionados por Bilenky sobre as perspectivas de alguma mudança no cenário de dominação das organizações criminosas pela via política, Olliveira disse ser muito pessimista. “Acho que esse barco das eleições já partiu. É muito difícil [alguma mudança] sem refundar a segurança pública. Hoje a única movimentação que existe é a PEC da Segurança, que não toca em questões centrais como o sistema penitenciário, onde surgiram todas as facções, e quer fazer da Polícia Rodoviária mais uma polícia armada”, disse.
“Me sinto na obrigação de fazer papel de otimista, para vocês verem como estamos mal”, brincou Paes Manso. O pesquisador disse trabalhar com uma ideia de redução de danos e que vê a PEC como uma possível saída. “É uma maneira de a União tentar entrar na discussão e exercer esse papel nacional. Você tem o crime se nacionalizando e, se não houver essa conversa nacional e tentar colocar na Constituição, realmente estaremos num barco furado.”
A quarta edição d’A Feira do Livro 2025 acontece de 14 a 22 de junho, na praça Charles Miller, no Pacaembu. Realizado pela Associação Quatro Cinco Um, pela Maré Produções e pelo Ministério da Cultura, o festival literário paulistano, a céu aberto e gratuito, reúne mais de duzentos autores e autoras do Brasil e do exterior em uma programação com mais de 250 atividades, entre debates, oficinas, contações de histórias e encontros literários. Confira a programação e outras notícias do festival.
A Feira do Livro 2025 · 14 — 22 jun. Praça Charles Miller, Pacaembu
A Feira do Livro é uma realização do Ministério da Cultura, por meio da Lei Rouanet – Incentivo a Projetos Culturais, Associação Quatro Cinco Um, organização sem fins lucrativos dedicada à difusão do livro e da leitura no Brasil, Maré Produções, empresa especializada em exposições e feiras culturais, e em parceria com a Prefeitura de São Paulo.