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A cobertura especial d’A Feira do Livro, que acontece de 14 a 22 de junho, é apresentada pelo Ministério da Cultura e pela Petrobras

MINISTÉRIO DA CULTURA E PETROBRAS APRESENTAM

O editor Jiro Takahashi (Nilton Fukuda)

A FEIRA DO LIVRO 2025,

Deveria existir parceria entre games e livros, diz criador da série Para Gostar de Ler

Jiro Takahashi e Cecilia Arbolave, da Lote 42, discutiram a necessidade de tornar o livro um objeto interessante em si, para crianças e adultos, em mundo cheio de distrações

20jun2025

O hábito da leitura depende de três elementos básicos: saber ler, poder ler e querer ler, elenca Jiro Takahashi, criador das famosas séries Vaga-Lume e Para Gostar de Ler. Mas como permitir isso num mundo de tantas distrações e num tempo em que tudo tem urgência?

A solução passa por livros materialmente interessantes — e, para isso, a tecnologia pode ajudar, apontou a jornalista e editora Cecilia Arbolave, coordenadora da Lote 42, da Banca Tatuí, da Sala Tatuí, Livraria Gráfica e da Feira Miolo(s). “Mais que o livro digital, esse acesso a novas técnicas de impressão permitiu publicar uma enorme quantidade de vozes e de tipos de livros. Isso é uma revolução, isso permite pensar um modelo de negócio diferente em torno do livro.”

Os dois participaram da mesa Para Gostar de Ler, mediada pelo editor da Quatro Cinco Um Vitor Pamplona, na manhã desta sexta (20) n’A Feira do Livro.

O mundo em que a coleção Vaga-Lume foi lançada e o atual são muito diferentes, mas, para ambos, a solução para tornar o livro atrativo continua passando pelo lúdico. Na série criada por Takahashi, fruto da sua tentativa de fazer com que seus alunos de ensino fundamental se interessassem pela leitura, as obras precisavam ser contemporâneas, dirigidas a esse público jovem, e acompanhadas por um suplemento com atividades — como brincadeiras — que só poderiam ser feitas por quem leu o texto. 

Foram no total 105 livros publicados na coleção lançada pela Ática, como O escaravelho do diabo, de Lúcia Machado de Almeida, e Um cadáver ouve rádio, de Marcos Rey. No auge, as edições chegaram a vender 100 mil exemplares por tiragem, segundo Takahashi. 

“Quando vejo crianças jogando games, como Minecraft e Clash Royale, fico imaginando que deveria existir uma parceria multiplataforma entre um livro bem feito e o jogo. A pessoa teria que saber um pouco mais de história para ir melhor no jogo. Essa parceria está faltando. Ficamos nós [dos livros] com estilete, quando as big techs estão lá com motosserra”, opina o editor e professor.

São Paulo 20/06/2025 – Feira do Livro 2025 Pacaembu | Foto: Nilton Fukuda

Arbolave ressaltou a importância do lúdico também na produção voltada para adultos. “Quando fazemos um pop-up, ou um livro com barulho — algo diferente e que é permitido na literatura infantil  —, por algum motivo parece que não pode”, diz ela. “Não pensam que esse também é um caminho para se conectar de novo com o livro. Esse cuidado com o lúdico, a materialidade do livro, tem que atravessar todas as idades.”

Em tempos em que a oferta de entretenimento e a disputa pela atenção são tão acirradas, o caminho escolhido pela Lote 42 foi retomar o livro impresso e o potencial de expressão de sua materialidade, experimentando com diferentes formatos e técnicas, afirma a editora de origem argentina.

O interesse de Arbolave pela produção gráfica surgiu desde pequena, acompanhando a ida do pai à gráfica que imprime a revista editada por ele no país vizinho até hoje. “Quando começamos a editar nossos livros [na Lote 42], as gráficas perguntavam se eu gostaria de acompanhar a máquina, e eu comecei a ir. Esse universo para mim é uma escola”, afirma. Seus estudos e pesquisas em torno da produção gráfica são a base de seu O livro de fazer livros (Lote 42, 2024). 

A jornalista e editora Cecilia Arbolave (Nilton Fukuda)

“O que a Cecilia faz é brilhante, porque faz com que o livro seja materialmente querido”, disse Takahashi.

Para ele, outra barreira para que as pessoas caiam no gosto pela leitura no mundo atual é a hipercomodificação de tudo. “Houve uma época em que as pessoas buscavam no livro um conhecimento, uma informação, para resolver algo importante. Não era nem uma questão de dinheiro somente, mas para se posicionar na vida. Mas hoje a monetização ficou tão grande que, se por acaso a pessoa tiver dinheiro, ela não precisa de mais nada”, afirma.

Esse desafio também envolve o tempo, ou a falta dele, na avaliação do professor. “A escrita e a leitura brigam muito com a urgência. Esse é o grande nó da questão tecnológica. A tecnologia digital trouxe a urgência, tudo virou urgente. Mas a revisão não se faz urgentemente. Tenho que ler uma letra depois da outra. O jeito que lemos um texto hoje é o mesmo de quando se lia Homero e Aristóteles. A leitura humana, não de robô, é feita desse jeito”, disse.

Ele afirma que não acha que a série Vaga-Lume caberia hoje em uma editora de grande porte. “Tem editora hoje no Brasil que publica sessenta livros por mês. É possível dar atenção para cada um deles? Seguramente não”, avaliou.

O cachorro de Clarice Lispector

Takahashi contribuiu com a divulgação de grandes nomes da literatura brasileira, como Roberto Drummond, Clarice Lispector e Fernando Sabino, e lança n’A Feira Editando o editor 11 (Edusp). No livro, conta também algumas anedotas de seus quase sessenta anos de vida no meio literário.

Na mesa, ele contou um desses casos do livro, da época em que frequentava a casa de Lispector para discutir a edição de seus trabalhos. Segundo ele, a escritora o recebia sempre com um café: uma xícara para a visita, uma xícara para a anfitriã e um pires para o cachorro, Ulisses, que compartilhava da mesma bebida. “As pessoas dizem que isso é uma desumanidade com o cachorro, mas ele gosta”, segundo ele é o que ela respondia, quando questionada sobre a estranha dieta do animal. 

Um dia, Takahashi disse que perguntou se o nome do cão vinha do herói Ulisses, protagonista da Odisseia. Não era a primeira vez que ela ouvia a pergunta, e em geral respondia que sim. Mas, para ele, contou a história real: “Ulisses foi um namorado que eu tive, e ele foi tão bom comigo, e eu, tão ruim com ele. Agora eu botei o nome do cachorro de Ulisses, e cuido muito bem dele”.

A quarta edição d’A Feira do Livro 2025 acontece de 14 a 22 de junho, na praça Charles Miller, no Pacaembu. Realizado pela Associação Quatro Cinco Um, pela Maré Produções e pelo Ministério da Cultura, o festival literário paulistano, a céu aberto e gratuito, reúne mais de duzentos autores e autoras do Brasil e do exterior em uma programação com mais de 250 atividades, entre debates, oficinas, contações de histórias e encontros literários. Confira a programação e outras notícias do festival.

A Feira do Livro 2025 · 14 — 22 jun. Praça Charles Miller, Pacaembu

A Feira do Livro é uma realização do Ministério da Cultura, por meio da Lei Rouanet – Incentivo a Projetos Culturais, Associação Quatro Cinco Um, organização sem fins lucrativos dedicada à difusão do livro e da leitura no Brasil, Maré Produções, empresa especializada em exposições e feiras culturais, e em parceria com a Prefeitura de São Paulo.

Quem escreveu esse texto

Fernanda Perrin

É jornalista.