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A cobertura especial d’A Feira do Livro, que acontece de 14 a 22 de junho, é apresentada pelo Ministério da Cultura e pela Petrobras

MINISTÉRIO DA CULTURA E PETROBRAS APRESENTAM

O centenário do invisível: Dalton Trevisan por outros olhos, mesa no Tablado Literário Mário de Andrade, n’A Feira do Livro 2025. 14 de junho de 2025

A FEIRA DO LIVRO 2025,

‘Dalton Trevisan chega no mínimo múltiplo comum do sentimento humano’, diz Noemi Jaffe no centenário do autor

Ao lado de João Anzanello Carrascoza e Carlos Marcelo, autores falaram sobre linguagem, concisão e o horror presente na obra do vampiro de Curitiba

14jun2025

“Não é trivial alguém se dedicar à literatura por oito décadas.” Foi assim que o jornalista mineiro Rogério Faria Tavares abriu a mesa O centenário do invisível: Dalton Trevisan por outros olhos, no Tablado Literário Mário de Andrade, neste sábado (14), durante A Feira do Livro

Junto a outros autores contemporâneos, Noemi Jaffe, João Anzanello Carrascoza e Carlos Marcelo, que compuseram a mesa, participaram da coletânea de treze contos Os elefantes viriam pela manhã (Autêntica, 2025), organizada por Tavares em homenagem às oito décadas de produção literária do vampiro de Curitiba. 

O centenário do invisível: Dalton Trevisan por outros olhos, mesa no Tablado Literário Mário de Andrade, n’A Feira do Livro 2025. 14 de junho de 2025

Segundo Jaffe, o que mais impressiona em relação à obra de Dalton Trevisan é a concisão. Professora de escrita e literatura há mais de quarenta anos, disse que o conto “Uma vela para Dario” é exemplo recorrente em suas aulas. “Um homem que morre na rua e vai sendo subtraído de seus pertences. E o Dalton vai tirando também os artigos, os verbos, às vezes frases inteiras, que pareciam necessárias. A concisão dele diz mais pelo que não é dito.”

Para Carrascoza, o vampiro foi vital em sua carreira como contista, pela qualidade da construção dos personagens em meio a essa essa economia de linguagem. “As palavras somem do texto, fica apenas o fundamental. Ele é um sujeito elíptico, e pautou toda uma geração.”

O horror em nós

Tema presente na literatura de Trevisan, as relações sexuais e a intimidade entre personagens causa repulsa e fascínio em Carlos Marcelo, que disse que o autor “fazia do conto o lugar do que era indizível, impensável”. Segundo ele, mesmo as cenas mais bárbaras e violentas tinham uma linguagem extremamente trabalhada e pensada. “Entre quatro paredes, valia tudo pela criação. Vejo na escrita dele a palavra esculpida.”

E o que Dalton Trevisan fez com a linguagem, para Noemi Jaffe, é bastante similar ao que fez com os sentimentos humanos: “Ele chega no mínimo múltiplo comum, a paixão zero de todo mundo, que a gente não gosta de admitir que existe dentro da gente. Que é suja, feia”.

Na mesa, os autores relembraram alguns contos, todos um mergulho no terror e na precariedade. “O leitor espera que o texto se redima, mas isso não acontece. É um olhar fundo no horror que nos habita”, diz Jaffe. E Carrascoza complementa: “Revela nosso lado sombroso, apresenta as relações não pela pele, mas pela carne viva”.

Carlos Marcelo comentou ainda sobre a relação quase missionária de Dalton com a literatura. “Quem fala sobre ele é sua própria obra. Trabalhou tanto nisso que a presença física quase não tem importância.” E elogia a capacidade do vampiro de abraçar as críticas que lhe foram feitas durante a carreira: “Ele tinha tanta confiança que dava de ombros para isso. Transformava as críticas, inclusive, em parte dos contos dele”.

Encanto com as palavras

A capital paranaense, sua cidade natal, esteve muito presente em sua obra, de diferentes maneiras. Um consenso dos autores na mesa é que a Curitiba apresentada por Dalton Trevisan ganha novas cores e camadas em seus textos: “É como se ele inventasse a cidade enquanto a nomeia. Nomeava o que quase ninguém reparava, as vozes clandestinas, em surdina”, diz Jaffe.

Escritora Noemi Jaffe

“Ele tinha um ouvido para as ruas”, afirma Carlos Marcelo. Não só escutava seu entorno, como traduzia: “Parecia uma criança brincando com as palavras. Descobria termos e os usava para salpicar seus contos. Tinha um encanto com as palavras”. 

A professora e crítica literária Eliane Robert Moraes, que estava na plateia e escreveu a orelha da coletânea, ao final da mesa, arrematou: “Um autor que escreve sobre vampiros e tem a coragem de criar um personagem desdentado – essa é a literatura de Dalton Trevisan”. 

A quarta edição d’A Feira do Livro 2025 acontece de 14 a 22 de junho, na praça Charles Miller, no Pacaembu. Realizado pela Associação Quatro Cinco Um, pela Maré Produções e pelo Ministério da Cultura, o festival literário paulistano, a céu aberto e gratuito, reúne mais de duzentos autores e autoras do Brasil e do exterior em uma programação com mais de 250 atividades, entre debates, oficinas, contações de histórias e encontros literários. Confira a programação e outras notícias do festival.

A Feira do Livro
14 a 22 de junho de 2025
Praça Charles Miller – Pacaembu – São Paulo/SP
Entrada gratuita

A Feira do Livro 2025 · 14 — 22 jun. Praça Charles Miller, Pacaembu

A Feira do Livro é uma realização do Ministério da Cultura, por meio da Lei Rouanet – Incentivo a Projetos Culturais, Associação Quatro Cinco Um, organização sem fins lucrativos dedicada à difusão do livro e da leitura no Brasil, Maré Produções, empresa especializada em exposições e feiras culturais, e em parceria com a Prefeitura de São Paulo.

Quem escreveu esse texto

Manuela Stelzer