Arte e Letra

No centro comercial de Curitiba, numa das regiões mais movimentadas da capital paranaense, entre casas e edifícios históricos, a livraria Arte e Letra chama atenção desde o gradeado do portão. Subindo poucos degraus, o visitante adentra um casarão repleto de plantas, ornamentos, estantes de livros e um aconchegante espaço com mesas, cadeiras e balcão de cafeteria. 

Criada em 2004 como editora, a Arte e Letra decidiu abrir um ponto de venda próprio dois anos depois devido às dificuldades de distribuição no mercado brasileiro. A primeira versão da livraria ficava no interior do Lucca Café, um dos mais tradicionais da cidade. Eram poucas prateleiras e um acervo modesto, de títulos limitados. A proposta era ser um ambiente literário dentro de um café, numa inversão do habitual café dentro de uma livraria. 

Com o crescente interesse do público, o espaço logo se tornou insuficiente para acomodar os leitores. Depois de passar por outros dois endereços, sempre casarões num mesmo quarteirão do centro curitibano, a Arte e Letra chegou ao espaço atual em 2019.

A livraria é gerida pelo sócio-fundador Thiago Tizzot e seu irmão, Frede. O acervo reúne entre 4 mil e 5 mil títulos, com curadoria que equilibra escolhas pessoais e tendências literárias. “Inicialmente eu mesmo escolhia livros que já tinha lido ou que queria ler. Hoje, isso se expandiu. Passamos a ouvir mais as demandas do público e das tendências que a gente detecta em pesquisas internas”, conta Thiago. O critério, porém, nunca mudou: “Buscamos ter livros de qualidade que dialogam com leitores exigentes e contribuem para o cenário literário”, diz o livreiro.

Daí o acervo conter muitas obras de autores vencedores do Nobel de Literatura ou de outras premiações importantes, nomes em voga no noticiário literário, figuras canônicas da ficção e não ficção, clássicos brasileiros e estrangeiros e uma estante inteira apenas dedicada a escritores e escritoras do Paraná.

“A ideia, de certa forma, sempre foi provocar o leitor”, explica Thiago. “As pessoas que leem acabam tendo certa tendência a serem acomodadas. Gostam de um tipo de livro, de um gênero específico, e ficam nisso. Não é uma coisa necessariamente ruim, mas a gente tem o objetivo de expandir horizontes.” 

Por isso, Thiago coloca autores similares menos conhecidos ao lado de nomes consagrados, para que o leitor de um seja atraído para o outro. Isso pauta também o trabalho da Arte e Letra em revistas literárias já editadas pela livraria, contendo materiais que se alternam entre escritores consolidados e outros a serem descobertos.

Ponto de encontro marcante da cena literária paranaense, a Arte e Letra com frequência sedia lançamentos, bate-papos com autores e tradutores e outras atividades culturais. Em 2023, Thiago organizou a Feira Literária de Curitiba (Flicu) e reuniu editoras locais para um dia inteiro de debates e vendas. “Tivemos a presença de nove editoras da cidade, cada uma tinha sua própria mesa”, relembra. 

No dia a dia, a Arte e Letra é conduzida por uma equipe pequena e próxima dos leitores, sempre com tratamento individual. Durante a manhã, a administração e o atendimento são feitos pelo próprio Thiago, que cuida de pedidos, reposições e organização geral. No período da tarde, livreiros contratados assumem o corpo a corpo com os frequentadores e a gestão de novas aquisições. 

Após o turno da manhã, Thiago cuida da editora Arte e Letra, que funciona nos fundos da livraria, numa sala visível a qualquer pessoa graças a uma espécie de “aquário” montado na área do café. Isso permite que curiosos vejam ao vivo o processo de feitura artesanal de um livro, algo característico das produções da Arte e Letra. “Isso fortalece o vínculo entre a obra e o público porque é possível conhecer um pouco desse trabalho que às vezes é tão invisível e ao mesmo tempo é o que faz com que a gente tenha lindas edições em mãos.”

Como está bem no centro, a livraria tem relação bastante orgânica com o entorno e já faz parte da paisagem urbana. “A região tem um perfil que combina com nosso público e, além disso, ajudamos a revitalizar lugares que estavam abandonados e hoje se tornaram pontos atrativos”, celebra Thiago. 

Para uma livraria tradicional em Curitiba, é natural a curiosidade sobre o mais curitibano dos escritores, Dalton Trevisan. O autor, falecido em 2024 aos 99 anos, teve três livros publicados pela Arte e Letra. No primeiro, A mão na pena, lançado em 2014, Dalton foi pessoalmente à livraria fazer revisões nas provas gráficas. O último foi uma reedição de seu livro de estreia, a novela Sonata ao luar, que nunca tinha sido reeditada desde a publicação original em 1945.

Em 2023, quando saiu a caixa Traçadas Linhas, que reúne todo o trabalho dele com o desenhista também curitibano Poty Lazzarotto (1924-1998), o escritor enviou uma mensagem de áudio a Thiago comentando a parceria. No ano seguinte, a Arte e Letra celebrou o que viria a ser o último aniversário de Dalton, em junho, com uma tarde de leituras de trechos de suas obras. O escritor também enviou um áudio em agradecimento.