i

A cobertura especial d’A Feira do Livro, que acontece de 14 a 22 de junho, é apresentada pelo Ministério da Cultura e pela Petrobras

MINISTÉRIO DA CULTURA E PETROBRAS APRESENTAM

Mesa Reparação: memória e reconhecimento n'A Feira do Livro (Nilton Fukuda)

A FEIRA DO LIVRO 2025,

Reparação da escravidão permanece tarefa urgente, dizem Luciana da Cruz Brito e Bianca Santana

A historiadora e a jornalista falaram sobre memória e formas de lidar com as desigualdades produzidas pela escravidão que permanecem até hoje

22jun2025

As consequências históricas da escravidão e do comércio de escravizados e a necessidade urgente e permanente de buscar formas de reparação foram o tema da conversa entre a historiadora e professora Luciana da Cruz Brito e a jornalista e escritora Bianca Santana, com mediação da tradutora e editora Fernanda Sousa, na mesa Reparação: memória e reconhecimento, na manhã deste domingo, 22. O papo foi motivado pelo lançamento do livro de mesmo nome, publicado pela editora Fósforo, que é resultado de um seminário organizado por Brito junto ao Instituto Ibirapitanga.

Brito ressaltou a necessidade de “reconhecer que não tem como reparar, que não vai zerar essa dívida, como diz Denise Ferreira da Silva, mas sem abrir mão de que se tem que lidar não só com o que foi deixado pelos quatrocentos anos de escravidão, mas também com aquilo que é produzido cotidianamente em termos de desigualdade racial. Se a gente não faz nada, a desigualdade não estagna, ela só aumenta”.

Luciana da Cruz Brito e Fernanda Sousa (Nilton Fukuda)

Santana concordou. “A gente corre riscos quando fala de reparação. Um deles é achar que dá para resolver o problema de forma rápida e permanente, que é um pouco o que se viu no Brasil em 2020 quando as pessoas ‘descobriram’ o racismo e todo mundo publicou imagens pretas nas suas redes sociais. O outro risco é esse, se é algo tão difícil e tão inalcançável, então vamos parar, porque não vai adiantar. A gente não pode cair nisso”, afirmou. “A gente precisa falar de reparação por causa da urgência do que precisa ser transformado neste país com muita seriedade, a urgência daquilo que não foi feito no 14 de maio [de 1888, da Abolição da Escravidão] e que precisa ser feito hoje. Com políticas públicas, claro, mas envolvendo toda a sociedade.”

Escrita e literatura

Uma das formas de reparação discutidas na mesa foi a que pode ser feita por meio da escrita e da literatura. “Nesse processo de escrita de uma história social mais recente, de historiadoras e historiadores mais engajados com questões políticas de expansão de direitos, dar importância histórica àquilo que não é considerado importante é a melhor forma de reparação”, acredita Brito, lembrando também seu papel como professora na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB).

“O tempo de sala de aula é muito maior que o tempo da escrita, porque o tempo da escrita demanda solidão. Mas na sala de aula, a necessidade de trabalhar a memória é cotidiana. A UFRB é uma universidade recente, de classe popular, a maioria dos alunos são negros, adultos, que serão professoras e professores. Então, a memória mais importante é a memória comunitária e familiar, e isso dá um nó, porque é dito para elas que ela não é importante. Essa memória só ganha espaço na sala de aula de história se você associa os acontecimentos históricos aos aspectos mais íntimos da vida deles.” 

Luciana da Cruz Brito, Fernanda Sousa e Bianca Santana (Nilton Fukuda)

“Eu tenho cada vez mais a sensação de que minha principal contribuição não é escrever, é estimular as pessoas a escrever, porque tem muita gente fantástica escrevendo muita coisa que às vezes fica guardada”, disse Santana. Ela ressaltou a importância de hoje já termos disponíveis em nossas estantes livros que trazem essa memória, como Úrsula, de Maria Firmina dos Reis, publicado em 1859 mas inacessível para muitas pessoas até pouco tempo atrás, e Becos da memória, que Conceição Evaristo escreveu em 1980 mas só conseguiu publicar em 2006.

“A literatura há muito tempo tem tratado das nossas questões sem perder a magia do que faz a literatura ser literatura”, disse. “Ver Conceição ser celebrada como uma das maiores autoras brasileiras é algo enorme. Essa coisa de listas não é muito boa, mas às vezes a gente fica feliz com elas. Teve essa lista da Folha [de S.Paulo] dos melhores livros brasileiros do século, e tivemos Um defeito de cor em primeiro lugar, Torto arado em segundo, O avesso da pele em terceiro, e Conceição um pouco abaixo com dois títulos, Olhos d’água e Ponciá Vicêncio. Tem algo muito importante acontecendo, que é o cânone reconhecendo a diversidade que tem a literatura brasileira.”

A quarta edição d’A Feira do Livro 2025 acontece de 14 a 22 de junho, na praça Charles Miller, no Pacaembu. Realizado pela Associação Quatro Cinco Um, pela Maré Produções e pelo Ministério da Cultura, o festival literário paulistano, a céu aberto e gratuito, reúne mais de duzentos autores e autoras do Brasil e do exterior em uma programação com mais de 250 atividades, entre debates, oficinas, contações de histórias e encontros literários. Confira a programação e outras notícias do festival.

A Feira do Livro 2025 · 14 — 22 jun. Praça Charles Miller, Pacaembu

A Feira do Livro é uma realização do Ministério da Cultura, por meio da Lei Rouanet – Incentivo a Projetos Culturais, Associação Quatro Cinco Um, organização sem fins lucrativos dedicada à difusão do livro e da leitura no Brasil, Maré Produções, empresa especializada em exposições e feiras culturais, e em parceria com a Prefeitura de São Paulo.