
A cobertura especial d’A Feira do Livro, que acontece de 14 a 22 de junho, é apresentada pelo Ministério da Cultura e pela Petrobras
MINISTÉRIO DA CULTURA E PETROBRAS APRESENTAM


A FEIRA DO LIVRO 2025,
Mary del Priore critica eufemismos obscenos para velhice e defende resgatar palavra ‘velho’
Historiadora lembra que a morte era um evento social para o qual nos preparávamos e que hoje é um ritual que procuramos esquecer
21jun2025A historiadora Mary del Priore diz que começou a perseguir as palavras “velho” e “velhice” para escrever Uma história da velhice no Brasil (Vestígio). Na mesa Envelhecer no Brasil, que teve mediação de Tatiana Vasconcellos e lotou o Auditório Armando Nogueira com gente de todas as idades na tarde deste sábado (21), ela criticou o que chamou de eufemismos obscenos para descrever essa fase da vida.
“Acho obscenas essas palavras que hoje são utilizadas para descrever esse momento da vida da gente, que pode ser muito pleno, mas também é cheio de sofrimentos, a começar pelas pessoas que perdemos nessa idade. ‘Envelhescência’, ‘feliz idade’, acho tudo isso uma grande bobagem.”

Del Priore contou o que compreendeu ao ler desde os relatos dos primeiros cronistas jesuítas no Brasil Colônia até testemunhos do Segundo Reinado: “A velhice era algo inevitável. O que preocupava as pessoas não era envelhecer, era em primeiro lugar ficar de pé até o fim, poder trabalhar. Outro dia ouvi o Ignácio de Loyola Brandão dizendo exatamente isso, ‘quero cair de pé, trabalharei até o fim’”.

Segundo a autora, hoje esquecemos de uma certa coletividade que cercava o ritual da morte. “A morte era um evento social. Todo mundo entrava na casa do doente para assistir o despasse, trepava na janela, abria a porta, cercava a cama. Há todo um ritual que faz com que as pessoas aceitem isso que está acontecendo em determinado momento da vida dela, o que nós hoje esquecemos. Vai tudo para o CTI, do CTI para o crematório, depois para o cemitério, onde tem cafezinho e vira jardim. Não tem nem mais cemitério, que foi o grande barato do século 19, inclusive de namoro.”
Ela citou a década de 1920 como um primeiro período de grande diferença geracional por dois motivos. Na Semana de Arte Moderna de 1922, jovens escritores como Mário de Andrade e Oswald de Andrade exaltavam a nova literatura contra a “velha literatura que era feita no Rio, na Academia Brasileira de Letras”.
Dois anos depois, em 1924, foi regulamentada a Previdência Social nos moldes como a conhecemos hoje. “Os homens não exultaram”, recordou Del Priore. “Eles tiveram um choque psicológico enorme porque passaram de ativos para inativos. Eram reconhecidos na rua, havia a Rua dos Aposentados.”
Ninguém ficava inútil
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As décadas seguintes levariam a um reposicionamento dos idosos na sociedade brasileira. “Antes ninguém ficava sem dar a sua parte, todo mundo tinha que fazer alguma coisa dentro de casa, ia bater um bolo, fazer uma costura, cuidar das crianças. Ninguém ficava inútil numa casa vendo televisão, que é uma infeliz invenção dos anos 1960 para os nossos velhos”, disse Del Priore.
Nessa época ocorreu a segunda clivagem relevante citada pela historiadora. “A revolução sexual, a chegada da pílula ao Brasil, os jovens que pegam em armas contra a ditadura. Palavras como ‘coroa’, ‘velha coroca’, ‘velho babão’, esse é o repertório dessa juventude. Eles olhavam para aquelas pessoas mais velhas e identificavam com crise econômica, o regime militar, a figura dos nossos generais, envelhecidos.”

Del Priore encerrou a conversa ressaltando que em breve os velhos superarão os jovens na pirâmide demográfica brasileira e que o país não está preparado para isso. “Em trinta anos, os velhos serão em número maior que os jovens, somos um país que está ganhando rugas a passos largos. Temos que buscar bom senso, não buscar ideais de velhice e envelhecimento, mas bom senso. Procurar estar em boa saúde, não preocupar nossos filhos e netos, organizar o nosso envelhecimento.”
A quarta edição d’A Feira do Livro 2025 acontece de 14 a 22 de junho, na praça Charles Miller, no Pacaembu. Realizado pela Associação Quatro Cinco Um, pela Maré Produções e pelo Ministério da Cultura, o festival literário paulistano, a céu aberto e gratuito, reúne mais de duzentos autores e autoras do Brasil e do exterior em uma programação com mais de 250 atividades, entre debates, oficinas, contações de histórias e encontros literários. Confira a programação e outras notícias do festival.
A Feira do Livro 2025 · 14 — 22 jun. Praça Charles Miller, Pacaembu
A Feira do Livro é uma realização do Ministério da Cultura, por meio da Lei Rouanet – Incentivo a Projetos Culturais, Associação Quatro Cinco Um, organização sem fins lucrativos dedicada à difusão do livro e da leitura no Brasil, Maré Produções, empresa especializada em exposições e feiras culturais, e em parceria com a Prefeitura de São Paulo.
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