A cobertura especial d’A Feira do Livro, que acontece de 14 a 22 de junho, é apresentada pelo Ministério da Cultura e pela Petrobras
MINISTÉRIO DA CULTURA E PETROBRAS APRESENTAM


A FEIRA DO LIVRO 2025,
‘Observei a diferença entre miséria e riqueza. A desigualdade marcou minha escrita’, diz Marilene Felinto
N’A Feira do Livro, a escritora pernambucana falou do elemento de vingança em seus romances e criticou o mercado editorial movido a celebridades e rankings
21jun2025Marilena Felinto está incomodada. A escritora, que está lançando Corsária (Ubu e Fósforo), participou de uma mesa d’A Feira do Livro na manhã deste sábado (21). No Auditório Armando Nogueira, ela conversou com a jornalista Luciana Araujo Marques sobre seu novo romance e respondeu às perguntas da plateia, mas não sem antes ler uma espécie de manifesto contra os eventos públicos que sucedem o lançamento de um livro.
“A minha ferramenta é a linguagem. Além de escrever, tenho que falar, mas não falo muito bem. E ainda preciso dar a cara e mostrar minha humilhação em público”, disse a escritora, que criticou os parâmetros do mercado neoliberal da arte, como curtidas na rede. “O cânone hoje é baseado em ranking. Escritores transformados em celebridades surgem todos os dias.”
Questionando a si mesma por estar no palco, disse que talvez tratasse disso em uma possível autobiografia e, em seguida, citou Dostoiévski: “É preciso nutrir por si mesmo uma paixão desprezível para escrever uma autobiografia”.

Mas a escritora, enfim, falou de seu livro e de seu processo de escrita — querendo ou não. “Invejo a capacidade de resumir livro. Meu movimento de escrita é muito esquizofrênico. Quando volto [ao livro], é tão fragmentado que parece que não tem enredo para contar. Não sei falar, por isso também me incomoda estar aqui.”
Um dos disparadores para escrever Corsária foi um elemento de vingança contra as injustiças sociais. Aliás, não só do último romance. “Conheci as feiras-livres da região metropolitana do Recife, onde cresci, e isso me marcou profundamente. Foi onde observei a diferença entre miséria e riqueza. A desigualdade marcou minha escrita”, contou a autora de As mulheres de Tijucopapo, vencedor do Jabuti em 1982 e relançado em 2021 pela Ubu.
Em Corsária, a protagonista tenta se vingar da incapacidade de a geração anterior ir em busca de justiça, e constata que só se faz reparação de alguns aspectos, o que é uma frustração. “Esse enredo que estou resumindo é horrível, não é o que está escrito no livro”, brincou.
Literatura negra
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As perguntas da plateia começaram a chegar e uma delas perguntava se Marilene considerava sua obra parte da chamada literatura negra — e se concordava com essa categorização.
“Apoio totalmente categorias atuais, como literatura negra, queer, indígena. Mas o que move minha literatura não é minha negritude ou eventual origem indígena. Isso não significa que não apoie: é a reparação, a reconstituição de um lugar para esses escritores.”
O que a levou à literatura foi a mudança da família de Recife para São Paulo, um trauma enorme, segundo ela, que disse escrever não sobre isso, mas a partir disso.
Aprender a falar “paulistano” foi para ela como dominar uma língua estrangeira, um aprendizado de escrita, contou, sem deixar de pontuar que não faz literatura que fale do nordeste. “Nunca é uma coisa só, uma língua só. Isso acaba reduzindo a literatura a um só aspecto: negra, periférica etc.”
Sobre a função da ficção, outra pergunta da plateia, Marilene afirmou que a literatura não dá conta de nada: “Não consegue mudar a realidade geral, mas muda algumas pessoas, consegue interferir na subjetividade. Se eu não tivesse tido contato com os livros, seria muito mais louca do que sou hoje. E não pode ser normal uma pessoa que escreve, sinceramente”, respondeu.
A escritora disse ainda não acompanhar a onda das literaturas periféricas. “Não me sinto autorizada a avaliar a literatura das pessoas mais jovens. Sou velha, não tenho tempo para ler”, disse, acrescentando que prefere a literatura que não vem de lugar nenhum, mas sim que vem de vários lugares.
A quarta edição d’A Feira do Livro 2025 acontece de 14 a 22 de junho, na praça Charles Miller, no Pacaembu. Realizado pela Associação Quatro Cinco Um, pela Maré Produções e pelo Ministério da Cultura, o festival literário paulistano, a céu aberto e gratuito, reúne mais de duzentos autores e autoras do Brasil e do exterior em uma programação com mais de 250 atividades, entre debates, oficinas, contações de histórias e encontros literários. Confira a programação e outras notícias do festival.
A Feira do Livro 2025 · 14 — 22 jun. Praça Charles Miller, Pacaembu
A Feira do Livro é uma realização do Ministério da Cultura, por meio da Lei Rouanet – Incentivo a Projetos Culturais, Associação Quatro Cinco Um, organização sem fins lucrativos dedicada à difusão do livro e da leitura no Brasil, Maré Produções, empresa especializada em exposições e feiras culturais, e em parceria com a Prefeitura de São Paulo.