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A cobertura especial d’A Feira do Livro, que acontece de 14 a 22 de junho, é apresentada pelo Ministério da Cultura e pela Petrobras

MINISTÉRIO DA CULTURA E PETROBRAS APRESENTAM

Ana Carolina Mesquita e Beth Leites n'A Feira do Livro (Matias Maxx)

A FEIRA DO LIVRO 2025,

Virginia Woolf escancara a nossa estagnação enquanto sociedade, diz Ana Carolina Mesquita

A tradutora da nova edição de Mrs Dalloway, publicado há cem anos, reflete sobre a atemporalidade do clássico n’A Feira do Livro 2025

19jun2025

Assim como o dia narrado em Mrs Dalloway, o debate n’A Feira do Livro 2025 sobre o romance de Virginia Woolf aconteceu em uma quarta-feira no meio de junho. Pesquisadora e tradutora de diversos escritos da autora britânica, entre eles quatro diários e o próprio Mrs Dalloway, publicados pela Nós, Ana Carolina Mesquita conversou com a jornalista e mediadora de clubes de leitura Beth Leites no Auditório Armando Nogueira sobre a vasta produção literária da escritora, que ainda se mantém tão atual. 

Publicado há cem anos, Mrs Dalloway abarca várias das críticas de Virginia Woolf à sociedade vitoriana, como as restrições impostas pelos papéis sociais, analisa Mesquita. Por meio de Clarissa, protagonista do romance, a autora celebra a relativa liberdade da mulher na época. “Clarissa é uma epítome de uma mulher que depois de muitos séculos pôde sair sem um acompanhante. A própria Virginia, quando era criança, não pôde fazer isso”, afirmou Mesquita. 

Detalhes e cavernas 

A tradutora destacou que Woolf também estabelece essa crítica social ao mergulhar na espiral psicológica não só da protagonista, como de todos os outros personagens que aparecem no romance. “Virginia queria se desvencilhar do realismo da Inglaterra vitoriana, que se importava só com os grandes feitos e deixava de fora tudo o que se passava no interior”, disse. 

Ana Carolina Mesquita (Matias Maxx)

Sua atenção aos feitos diminutos se torna evidente em Mrs Dalloway, quando retrata um dia na vida da protagonista que vai comprar flores para sua festa e flanar pelas ruas de Londres. Segundo Mesquita, é assim que Woolf inaugura uma forma inovadora: “Ela pode falar de tudo: de sair da rua para comprar lápis, da morte de uma mariposa, da guerra, da condição das mulheres, dos escritores, da literatura. Tudo lhe interessava, era uma pessoa muito curiosa”. 

Mesquita também falou sobre o recurso que ela denominou de “cavernas” em suas pesquisas, referente ao entrelace das experiências dos personagens, que vão aparecer também em outras obras. “Com isso, ela consegue lançar diversas noções que estavam muito entranhadas no pensamento da época, que não são só literárias, mas que também são pensamento de vida”, afirmou. 

Traduzir Mrs Dalloway cem anos depois

Durante a mesa, Leites fez a pergunta que não queria calar: “por que traduzir Mrs Dalloway depois de tantas traduções já feitas?”. Na resposta, Mesquita citou não apenas a necessidade de atualização contínua das traduções — principalmente de clássicos — como também as discussões ainda tão atuais presentes no romance. 

Além das questões de gênero, Woolf também fez críticas ao imperialismo e ao controle da sexualidade, o que revela, na visão de Mesquita, o pouco avanço da sociedade contemporânea. “A gente não avançou muito, talvez por isso o romance reverbere tanto”, disse. 

Mrs Dalloway permanece tão atual que virou meme nas redes sociais durante a pandemia, relembra a tradutora, arrancando risos da plateia. “Mrs Dalloway disse que ela mesmo sairia às ruas para comprar o álcool gel”, dizia um tweet citado por Mesquita que parafraseia a famosa primeira frase do romance (“Mrs. Dalloway disse que ela mesma iria comprar as flores”), traçando a analogia de que a sensação de liberdade após a covid-19 era a mesma que Clarissa sentiu ao sair de casa naquele dia de junho, há cem anos. 

A quarta edição d’A Feira do Livro 2025 acontece de 14 a 22 de junho, na praça Charles Miller, no Pacaembu. Realizado pela Associação Quatro Cinco Um, pela Maré Produções e pelo Ministério da Cultura, o festival literário paulistano, a céu aberto e gratuito, reúne mais de duzentos autores e autoras do Brasil e do exterior em uma programação com mais de 250 atividades, entre debates, oficinas, contações de histórias e encontros literários. Confira a programação e outras notícias do festival.

A Feira do Livro 2025 · 14 — 22 jun. Praça Charles Miller, Pacaembu

A Feira do Livro é uma realização do Ministério da Cultura, por meio da Lei Rouanet – Incentivo a Projetos Culturais, Associação Quatro Cinco Um, organização sem fins lucrativos dedicada à difusão do livro e da leitura no Brasil, Maré Produções, empresa especializada em exposições e feiras culturais, e em parceria com a Prefeitura de São Paulo.

Quem escreveu esse texto

Maria Fernanda Barros

É estudante de Jornalismo na ECA-USP e estagiária editorial na Quatro Cinco Um.