A cobertura especial d’A Feira do Livro, que acontece de 14 a 22 de junho, é apresentada pelo Ministério da Cultura e pela Petrobras
MINISTÉRIO DA CULTURA E PETROBRAS APRESENTAM

A FEIRA DO LIVRO 2025,
‘É mais fácil escrever do que enfrentar as coisas na vida’, diz Panayotis Pascot
Humorista francês fala de depressão e sexualidade e conta como foi lançado à escrita ao saber da iminente morte do pai
15jun2025O francês Panayotis Pascot já era famoso por participar de programas na televisão e pelo seu espetáculo de stand-up Quase quando, em 2023, publicou na França Da próxima vez que você cair do cavalo, recém-lançado no Brasil pela editora Ercolano em tradução de Francesca Angiolillo. Nesse franco relato autobiográfico, o ator e humorista tenta organizar as reflexões e sentimentos dos dias que se seguiram ao anúncio de que seu pai, com quem mantinha relação distante, em breve morreria.
A obra teve mais de 350 mil exemplares vendidos na França e transformou Pascot, com apenas 26 anos, em um fenômeno literário ao refletir sobre temas como depressão e homossexualidade.

“Muita gente fala de coragem em autoficção, de como falar de uma história a partir de coisas da nossa própria vida embarca pessoas, leva gente junto nesse barco, mas eu não acho isso. Acho que é um pouco de covardia contar as coisas cada um no seu cantinho. É mais fácil escrever do que enfrentar as coisas na vida”, afirmou Pascot neste domingo (15), n’A Feira do Livro, na mesa Cair do cavalo, que teve mediação de Beatriz Muylaert, editora da Quatro Cinco Um.
O autor contou que o gatilho para a escrita do livro se deu quando percebeu que não sentiu nenhuma emoção ao ouvir a notícia de que o pai estava gravemente doente e à beira da morte. “Precisava de uma desconexão para poder escrever. Foi um processo longo, comecei vomitando linhas e linhas de texto, não sabia onde isso ia dar. Sentia a necessidade de expiação de minhas emoções para que eu pudesse lidar com elas”, disse Pascot. Ele comparou a escrita a um funil, inicialmente “com uma boca muito larga e que foi caindo a conta-gotas no final”.
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O autor lembrou as crises de angústia que sentiu na véspera da publicação do livro, quando tentou desistir de tudo e foi impedido por sua editora francesa. “Se fosse só por mim, o livro não teria sido publicado”, contou. Mesmo no dia do lançamento, a visão dos exemplares expostos na livraria provocou em Pascot uma ânsia de vômito. “Pensei: fiz uma tremenda besteira.”
Mas a escrita já havia se revelado um canal importante para o autor se reconectar consigo mesmo. A morte de uma criança na família, contou, teve grande impacto sobre ele na passagem da infância para a adolescência. “Naquela noite, parecia que tinha um tremendo bolo no estômago, não podia pensar, não podia falar, não podia comer, me tornei um bloco de granito. Então minha mãe me deu um caderninho para escrever e aí liberou. O que a gente atravessa pode existir do lado de fora, não precisamos carregar dentro de nós.”
Criança malvada
A infância passada em Bondoufle, sendo o caçula de seis irmãos, foi uma experiência fantástica, nas palavras dele, mas também solitária. “Morava em uma cidade pequenininha a cerca de uma hora de Paris e era uma criança solitária, no meu canto. Era muito fã dos humoristas, de gente que fazia piada. É uma das formas mais gratificantes de reunir as pessoas, de ter gente numa mesma energia, acho isso maluco.”
Em um dos vários momentos em que Pascot arrancou risos do público, o francês lembrou como foi uma criança malvada. “Entendi muito cedo o poder esmagador e nocivo da piada graças à minha família, apontando com humor o defeito da outra pessoa. Fui muito malvado na escola com um colega, todo mundo dizia que ele era gay e na verdade ele tinha namorada, eu não”, lembrou.
Até que se arrependeu. “Um dia usei todas as minhas economias, fui na Fnac e comprei um monte de CDs para todo mundo com quem eu tinha sido malvado com minhas piadas. ‘Você aceita um Beatles e minhas desculpas?’”, brincou.
Depressão
Em uma passagem (ainda mais) sensível do livro, Pascot narra uma tentativa de suicídio. Ao recordar esse episódio, o autor afirmou que “foi um momento de muita saturação, uma depressão muito particular ligada à paranoia”. “Naquele momento eu não sabia que tinha isso [depressão], era tabu na minha família. Achei que eu era uma péssima pessoa, muito malvado com quem me cercava. Foi como se eu batesse no fundo da piscina para subir de novo, um momento de luz.”
Quando recebeu o diagnóstico de depressão melancólica, Pascot relatou que escreveu para seu conterrâneo Emmanuel Carrère — autor de um célebre relato sobre o tema, o livro Ioga (Alfaguara, 2023). “Ele me ajudou muito com conselhos de escrita. A partir do momento que você reler o texto, não mexa mais.”
Em outro momento de leveza, uma pergunta do público questionou a relação de Pascot com o futebol, já que a conversa acontecia ao lado do Museu do Futebol. “Minha maneira de cruzar as pernas responde a minha relação com o futebol: zero. Aqui [no Brasil] entendi que é quase uma religião. Muitas vezes eu tentei, penso que gostei um pouquinho durante um tempo, mas o futebol não gostou nada de mim. O que eu gosto nas grandes finais de futebol é de olhar as pessoas, essa espécie de felicidade simples que elas têm durante uma partida.”
A quarta edição d’A Feira do Livro 2025 acontece de 14 a 22 de junho, na praça Charles Miller, no Pacaembu. Realizado pela Associação Quatro Cinco Um, pela Maré Produções e pelo Ministério da Cultura, o festival literário paulistano, a céu aberto e gratuito, reúne mais de duzentos autores e autoras do Brasil e do exterior em uma programação com mais de 250 atividades, entre debates, oficinas, contações de histórias e encontros literários. Confira a programação e outras notícias do festival.
A Feira do Livro 2025 · 14 — 22 jun. Praça Charles Miller, Pacaembu
A Feira do Livro é uma realização do Ministério da Cultura, por meio da Lei Rouanet – Incentivo a Projetos Culturais, Associação Quatro Cinco Um, organização sem fins lucrativos dedicada à difusão do livro e da leitura no Brasil, Maré Produções, empresa especializada em exposições e feiras culturais, e em parceria com a Prefeitura de São Paulo.
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