Listão da Semana,

Literatura fora do eixo e 10 lançamentos

Reedição de ‘Casa de alvenaria’ chega às livrarias. Carolina Maria de Jesus nos mostra que a vida literária fora dos principais eixos geográficos vive e merece ser celebrada

06ago2021 | Edição #48

Diz-se que a escritora Carolina Maria de Jesus (capa da Quatro Cinco Um neste mês) foi descoberta pelo jornalista Audálio Dantas enquanto este fazia uma reportagem na favela paulistana onde ela morava. Em sua resenha sobre Casa de alvenaria, livro de Carolina cuja reedição chega nesta semana às livrarias, a jornalista Yasmin Santos propõe o inverso: “Foi Carolina quem descobriu Audálio e aproveitou o encontro para apresentar seus escritos”. Carolina mostra que a vida literária fora dos principais eixos geográficos (e a que é diversa também em questões sociais, raciais, étnicos, de gênero) vive e merece ser celebrada. É a proposta de Geração 2010: o sertão é o mundo, outro lançamento desta semana, uma antologia organizada a partir de uma perspectiva decolonizada nas temáticas e nos formatos, com textos de pessoas vindas dos sertões, florestas e pequenas cidades do Brasil.

Completam a seleção da semana uma análise sobre a história social da beleza negra, a reunião dos poemas de Leonardo Fróes, o novo livro de André Sant’Anna, contos de Ana Maria Machado, um estudo sobre a nova direita brasileira, poemas infantojuvenis de Manoel de Barros e reflexões sobre como melhorar o planeta para gerações futuras.

Viva o livro brasileiro!

     

Casa de alvenaria. Carolina Maria de Jesus.
Companhia das Letras • 232 pp (vol. 1) e 520 pp (vol. 2) • R$ 39,90 (vol. 1) e R$ 59,90 (vol. 2)

Dividido em dois volumes, Casa de alvenaria retrata a vida da escritora depois de deixar a favela, após o imenso sucesso alcançado por Quarto de despejo (1960). Como assinala Yasmin Santos em sua resenha na Quatro Cinco Um de agosto — que traz Carolina Maria de Jesus na capa —, no livro “não há mais aquela poética esperançosa de Quarto de despejo. Carolina agora padece no próprio sonho. A escritora é dura com a sociedade que a recebeu, é sarcástica”. Lançada em 1961, a obra teve tiragem inicial de 30 mil exemplares, mas a acolhida não foi a que a autora esperava. Leia a resenha na íntegra.

Leia também: Além da escrita, Carolina Maria de Jesus ficou conhecida por dizer o que pensava sobre tudo e todos, incluindo JK, Jango e Jorge Amado.

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Geração 2010: o sertão é o mundo. Diversos autores.
Org. Fred Di Giacomo • Reformatório • 200 pp. • R$ 46

A antologia com 25 escritores brasileiros contemporâneos é organizada a partir de uma perspectiva decolonizada nas temáticas e nos formatos. O livro inclui grande número de mulheres, negros, indígenas e pessoas LGBTQIA+, vindos dos sertões, florestas e cidades pequenas. Entre eles estão Ailton Krenak, Itamar Vieira Jr., Jarid Arraes, Julie Dorrico, Krishna Monteiro, Nara Vidal, Natália Borges Polesso, Maria Valeria Rezende, Marcia Kambeba, Bruno Ribeiro e Micheliny Verunschk. 

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História social da beleza negra. Giovana Xavier.
Rosa dos Tempos/Record • 160 pp. • R$ 49,90

A professora da UFRJ, historiadora e teórica do feminismo negro mostra o impacto do racismo nos costumes ao mostrar a gênese de uma indústria cosmética voltada para as mulheres negras na virada do século 19 para o 20, que tinha a brancura como padrão universal de beleza. Na época, multiplicaram-se cremes para clarear a pele e tônicos para alisar o cabelo, e a autora mostra que a busca por uma tez mais clara e um cabelo mais liso iam muito além da estética, representando também proteção contra violência e até maior probabilidade de conseguir um emprego melhor.

Trecho do livro: “Na cosmética negra, clarear a pele era uma proposta para mulheres de compleição escura melhorarem de vida e alcançarem a equidade racial, individual e familiar. No anúncio ‘Conselhos para compleições escuras’, antes das recomendações, o Dr. Palmer definia a beleza: ser branca e ter um cabelo ‘exuberante’. Essa era uma conquista possível com o uso de um sabonete e uma pomada facial que branqueavam a pele e de um creme capilar que alisava e fazia o cabelo crescer. Representadas no discurso da supremacia branca como um “problema”, devido à sexualidade desenfreada e ao primitivismo, mulheres negras eram convencidas a apostar nos bleachings como possibilidade de se afastar dessa sombra”.

Leia também: Toni Morrison, ganhadora do Nobel de Literatura, toca na questão da identidade negra que se dá por meio da cor.

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Poesia reunida. Leonardo Fróes.
Apres. Cide Piquet • Editora 34 • 424 pp. • R$ 84

 antologia reúne onze livros de poemas do escritor e naturalista fluminense (que completou oitenta anos em fevereiro), desde Língua franca (1968) e A vida em comum (1969) até o inédito A pandemônia e outros poemas (2021), cujo poema-título saiu originalmente na Quatro Cinco Um em junho de 2020. O livro contém ainda ensaios de Ivan Junqueira (“A poesia como fábula”), José Thomaz Brum (“Natureza e consolação em Leonardo Fróes”) e Fabrício Carpinejar (“A ‘insignificância perfeita’ de Leonardo Fróes”). Ganhador dos prêmios Jabuti e Alceu Amoroso Lima, Fróes recebeu também prêmios de tradução da Biblioteca Nacional e da Academia Brasileira de Letras.


Leonardo Fróes Cassiano Lustosa Fróes/Divulgação
 

Leia também: Por uma década, o poeta Leonardo Fróes registrou no jornal os segredos de botânica que encontrou no sítio onde mora.

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Discurso sobre a metástase: histórias. André Sant’Anna. 
Todavia • 216 pp. • R$ 64,90

O escritor e músico mineiro, autor de Sexo (1999) e O paraíso é bem bacana (2006), expõe a visão de mundo do “brasileiro médio” sobre a bondade de Deus e a maldade das vacas, oferece conselhos para a humanidade (“Você vai vencer! Basta manter sua estupidez à vista de todos”), explica por que o homem foi expulso do Jardim do Éden e aponta as causas dos problemas do Brasil: “A culpa é toda do direitos humanos que vem aqui pra se meter no Brasil e não cuida dos problemas deles mesmos, desses países que se acha. Porque lá todo mundo faz o que quer”.

Leia também: Djamila Ribeiro resenha livro infantojuvenil sobre os deuses do candomblé.

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Vestígios: contos. Ana Maria Machado.
Alfaguara/Companhia das Letras • 112 pp. • R$ 49,90

A escritora carioca escreve onze histórias líricas sobre personagens cujas escolhas no presente se enraízam em memórias afetivas: duas irmãs que competem pelo amor do pai, uma mulher que descobre uma infidelidade, uma mãe com dificuldades para se relacionar com o filho e por aí vai. Ana Maria Machado recebeu o prêmio Jabuti em 1978 por História meio ao contrário e, no ano 2000, ganhou o Hans Christian Andersen, o mais prestigiado prêmio da literatura infantojuvenil. Em 2001, a Academia Brasileira de Letras lhe concedeu o prêmio Machado de Assis pelo conjunto da obra. Dois anos depois, foi eleita para a cadeira número 1 da ABL. Conquistou também os prêmios Casa de Las Americas, Bienal de SP, APCA, Cecília Meireles, Otávio de Faria e Adolfo Aizen.

Leia também: Ana Maria Machado fala das histórias que marcaram a sua infância.

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Menos Marx, mais Mises: o liberalismo e a nova direita no Brasil. Camila Rocha.
Todavia • 240 pp. • R$ 69,90

O livro descreve o surgimento da intelectualidade de direita no Brasil, rastreando suas origens desde a criação dos think tanks norte-americanos voltados para a difusão das ideias de Hayek e Mises após a Segunda Guerra Mundial até as organizações recentes, criadas no final da ditadura militar. A autora sustenta que a nova direita brasileira é um amálgama ultraliberal-conservadora que remonta à organização de contra-públicos digitais durante o auge do lulismo, que impulsionaram a campanha pelo impeachment de Dilma em 2016 e a eleição de Jair Bolsonaro em 2018.

Leia também: Por ir longe demais em sua recusa a admitir a ameaça real da Covid-19, Bolsonaro é hoje o mais radical dos líderes da extrema direita.

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Como ser um bom ancestral: a arte de pensar o futuro num mundo imediatista. Roman Krznaric.
Trad. Maria Luiza X. de A. Borges • Zahar/Companhia das Letras • 328 pp. • R$ 79,90

Um dos fundadores da The School of Life (2008) e do Museu da Empatia (2015), o filósofo australiano radicado no Reino Unido, autor do bestseller O poder da empatia, sustenta que é preciso superar a busca por recompensas imediatas e estimular o pensamento de longo prazo, para permitir a criação de um mundo melhor para os nossos descendentes. Para isso ele apresenta seis maneiras de desenvolver o pensamento de longo prazo, entre elas aprender com a ascensão e a queda das civilizações e iniciar projetos cujos resultados não veremos em vida. 

Leia também: Filósofo italiano diz que a sociedade contemporânea caminha para a extinção e ter a catástrofe como inevitável é a condição para evitá-la.

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Exercícios de ser criança. Manoel de Barros.
Ils. Fernanda Massotti e Kammal João • Companhia das Letrinhas • 48  pp. • R$ 54,90

Com duas histórias — sobre um menino que carregava água na peneira e uma menina avoada que gosta de viajar —, o primeiro livro de poemas de Manoel de Barros voltado ao público infantojuvenil tem reedição com ilustrações inéditas feitas em parceria por Kammal João e Fernanda Massotti.

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Quem escreveu esse texto

Marília Kodic

Jornalista e tradutora, é co-autora de Moda ilustrada (Luste).

Mauricio Puls

É autor de Arquitetura e filosofia (Annablume) e O significado da pintura abstrata (Perspectiva), e editor-assistente da Quatro Cinco Um.

Matéria publicada na edição impressa #48 em junho de 2021.